Entusiasmo com o Brasil é apenas nuvem passageira |
William Eid Junior |
De uma hora para a outra o Brasil virou a bola da vez para os investidores internacionais. Segundo o noticiário, somos invejados em todo o mundo. Passamos pela crise incólumes, e melhor, com perspectivas excelentes. Há até futurólogos que voltam a falar que o Brasil será uma das grandes potências globais num futuro não muito distante. Mas o que é que aconteceu para sermos tão adulados? Quais foram as grandes mudanças que fizemos para merecer tal destaque? Infelizmente, nada. Nada mesmo. É só observarmos os rankings mundiais feitos por diferentes instituições como Banco Mundial, Nações Unidas, Jornalistas sem Fronteiras, Transparência Internacional, Heritage Foudation e Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), dentre outras. Mas temos que olhar esses rankings como eles devem ser olhados. Não podemos nos comparar com países minúsculos e sem ex pressão nenhuma no globo. Somos uma das maiores economias e um dos países mais populosos do mundo. Assim, só é válida uma comparação com países grandes e com economias representativas. Talvez possamos incluir nesse grupo uns 40 países. Num estudo recente conduzido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) foram elencados 42 países e a posição do Brasil em diferentes aspectos. O resultado é assustador. Corrupção? Segundo a Transparência Internacional somos o mais corrupto entre os 42. Dificuldade para abrir um negócio? Idem, estamos na 42ª posição. Liberdade de imprensa, nível de educação e outros indicadores também mostram que o Brasil está muito longe de se tornar uma potência. A Unesco acaba de divulgar seu ranking de educação. Nossa 88ª posição é no mínimo vergonhosa. É até engraçado: insistimos no ensino do espanhol nas escolas quando nem sabemos inglês e, em alguns países europeus, o chinês é ensinado para cria nças. Claro, é com a China que essa geração vai ter que se entender. O mais interessante é que muitos veem nesses rankings melhoras do país. Passamos da 125ª posição para a 120ª e muitos comemoram. Mas não há o que comemorar. Em outros aspectos continuamos também na lanterna do mundo mais desenvolvido. Infraestrutura é um dos aspectos no qual quase nada foi feito nos últimos anos. É só compararmos estradas e ferrovias com as de outros países. Sem comentar os portos. Pior que tudo: não temos um plano de longo prazo para o país. O que queremos para 2040? 2050? Andamos hoje, como sempre, a reboque dos acontecimentos mundiais. Isso sem falar na violência, que é manchete constante na imprensa internacional. E voltamos aqui à questão inicial: porque nos tornamos a bola da vez? O motivo é simples: nosso sistema financeiro não estava exposto a riscos como o de outros países. Bancos no Brasil nunca precisaram se expor a r iscos excessivos para auferir ganhos. As operações são relativamente simples e os níveis de alavancagem são minúsculos quando comparados aos de outros países. Assim, não tivemos nenhum susto na área financeira, que pode continuar concedendo crédito como nunca vimos antes para uma população sedenta por bens de consumo. Pudemos manter, ao menos em parte, o nível de atividades da indústria, combalida pela queda nas exportações. Aliás, falando em exportações, na lista de 42 nações somos a 40ª em volume de exportações. Isto é, nossa penetração no mundo é pífia. Mas essa onda de boa vontade com o Brasil se manterá? Provavelmente não. É como se durante uma enchente só o nosso campo de futebol tenha se mantido acima das águas. Não temos arquibancada nem iluminação, nosso gramado é malcuidado. Mas como é o único campo utilizável, todos vieram aqui jogar. Assim que as águas baixarem, todos voltarão aos seus estádios. Alguns com pequenos estragos, mas nada que em pouco tempo não esteja recuperado. Aí vamos entender que o afluxo de torcedores e jogadores ao nosso campo foi apenas uma nuvem passageira. É hora de olharmos o Brasil como ele é. Um diagnóstico realista pode nos levar a tomar decisões com impacto positivo no futuro. Mas acreditarmos que nos tornamos o paraíso em poucos meses só nos prejudica. É mais do que tempo de olharmos o longo prazo sob pena de mais e mais nos distanciarmos dos países realmente desenvolvidos. William Eid Junior é professor titular e coordenador do GV CEF (Centro de Estudos em Finanças da FGV/EAESP) |
‘Freie seu entusiasmo com o Brasil’