ELEGIA À MANDIOCA

Simples assim. É só assistir é tentar a deglutição do papel ridículo a que todos os brasileiros somos levados, tendo como governantes pessoas desse tipo.

GOVERNANÇA ASSIMÉTRICA

A matéria jornalística abaixo, embora conheçamos a relação indecente entre os dois extremos aí expostos, é necessário assisti-la. Assim, o impacto que nos é dado é maior e talvez sirva para que comecemos a reagir de forma eficaz contra a anomalia.


http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2015/06/brasil-fica-no-ultimo-lugar-em-ranking-que-avalia-retorno-social-de-impostos.html

"O PONTO A QUE CHEGAMOS"

O artigo de Fernando Henrique Cardoso, trago-o por ser oportuno e ter origem confiável. Vale a pena sua leitura.
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O ponto a que chegamos

A oposição não deve escorregar para o populismo e, sim, apontar caminhos para superar os problemas. O fator previdenciário, por exemplo, é indispensável para o equilíbrio das finanças pública



Os brasileiros sentem a dor das oportunidades perdidas. Olhando em retrospectiva, não há dúvidas de que nos últimos anos houve uma guinada. Para a esquerda? Não, para o despropósito. O que havia sido penosamente reconstruído na década de 1990, o Plano Real; aresponsabilidade com as finanças públicas; o incentivo à iniciativa privada (sem subsídios descabidos); a manutenção do setor produtivo e financeiro estatal longe do alcance dos interesses clientelísticos; em suma, o início da reorganização do estado e, ao mesmo tempo, a reformulação e universalização do atendimento à saúde e à educação, bem como do acesso à terra, perdeu-se por “desmesura”. Em política econômica tão importante quanto o rumo é a dosagem. No caso, o rumo foi perdido e o limite da prudência na dosagem, ultrapassado.
Até quase o fim do primeiro mandato de Lula, o mantra de uma política econômica adequada (o tripé: metas de controle inflacionário, flutuação da taxa de câmbio e política monetária sem interferências políticas) se manteve, embora sinais preocupantes já começassem a aparecer. Beneficiado o país pelo boom mundial a partir de 2004, especialmente pelo alto preço das commodities e pela abundância de capital, até aquele momento muito havia a louvar na expansão das políticas sociais. Abandonado o Fome Zero, houve a aceitação silenciosa do programa “neoliberal” de transferências de rendas (bolsas sem contrapartida). Na ação internacional do governo era de se esperar mais para um país que, desde 1999, se elevara à categoria de um dos BRICs, nos quais os mercados viam um futuro promissor e as potências um parceiro a considerar.
O início da derrapada se deu com a substituição de Palocci por Mantega, com a falta de dosagem e com as concessões populistas que jogaram fumaça no escândalo do mensalão. A partir daí, a penetração partidária na máquina pública, que sempre esteve no DNA do PT por ele se considerar “herdeiro histórico” e principal agente do progressismo, se ampliou para abrigar a “base aliada”. Aos poucos, surgiu outra formulação “teórica” para o descontrole financeiro do governo: a dita “nova matriz econômica”. Esta substituiu a visão do governo do PSDB, que era social democrática contemporânea, isto é, entendia que o bom governo, para atender ao longo do tempo às demandas sociais, requer previsibilidade na condução das políticas econômicas.
O desastre que aí está é fruto de decisões desatinadas do lulopetismoe da obsessão pela permanência no poder, com a ajuda da corrupção e de medidas populistas que nada têm a ver com desenvolvimento econômico e social ou com os interesses nacionais e populares
processo de erosão simultânea do “presidencialismo de coalizão” e do bom senso na economia, embora originário do governo Lula, se tornou mais claro no primeiro mandato de Dilma: o “presidencialismo de coalizão” —no qual se supõe a aliança entre um número limitado de partidos para apoiar a agenda do governo no Congresso— se transformou em “presidencialismo de cooptação”. Nele, grandes e pequenos partidos (meros agregados de pessoas que visam o controle de um pedaço do orçamento) ideologicamente díspares, passam a tão somente carimbar as decisões do Executivo no Congresso em troca de penetração cada vez maior na máquina governamental e participação nos contratos públicos
Tão grave quanto o desvio das políticas macroeconômicas saudáveis, foi o desmazelo nas políticas setoriais, do petróleo ao etanol, passando pelo setor elétrico. Não me refiro à corrupção desvendada pela Operação Lava Jato —em si já muito grave—, mas aos erros de decisão: refinarias e complexos petroquímicos projetados com megalomania (Comperj, Abreu e Lima etc.), ou sem viabilidade econômica (no Ceará e no Maranhão), assim como um conjunto de estaleiros (11!) construídos para fornecer a custos altíssimos e por meio de engenharias financeiras duvidosas, tipo Sete Brasil, navios, plataformas e sondas para a Petrobras, com o sacrifício dos interesses da própria empresa e do país.
O mesmo exagero na dosagem se viu no FIES (deixando agora as universidades e os alunos na rua da amargura), no falecido trem bala, nas concessões de aeroportos à custa do BNDES, e também na política de “campeões nacionais”, financiada à custa da emissão de dívida cara pelo Tesouro para empréstimo a juros subsidiados de centenas de bilhões de reais a algumas empresas, sem transparência alguma. Políticas em si justificáveis e preexistentes, de estímulo ao “conteúdo nacional” e apoio ao empresariado brasileiro, foram deturpadas. Os erros são inumeráveis, como o controle do preço da gasolina, que levou usinas de cana à ruína, ou a redução demagógica das tarifas de energia elétrica quando a escassez de água já se desenhava no horizonte. Tudo isso revestido de uma linguagem “nacionalista” e de grandeza.
Não houve apenas roubalheira, mas uma visão política e econômica equivocada, desatenção ao bê-á-bá do manejo das finanças públicas e erros palmares de política setorial
Em suma: não houve apenas roubalheira, mas uma visão política e econômica equivocada, desatenção ao bê-á-bá do manejo das finanças públicas e erros palmares de política setorial. Sabemos quais foram os responsáveis pelo estado a que chegamos. Cobra-se agora das oposições: o que fazer? É preciso primeiro reconhecer que, dada a reeleição de Dilma e do PT, há que dizer: quem pariu Mateus que o embale. Tudo bem, é verdade. Mas o Brasil não é do governo ou da oposição, é de todos. A oposição de hoje será governo amanhã. Portanto, não deve escorregar para o populismo e, sim, apontar caminhos para superar os problemas acima citados. O fator previdenciário, por exemplo, é indispensável, a longo prazo, para o equilíbrio das finanças públicas. Se for para mudá-lo, que se encontre um substituto à altura. Pensando no Brasil, não cabe simplesmente fazer o seu funeral. Não nos aflijamos eleitoralmente antes do tempo. Neste momento o que importa é que o povo veja quem foram os verdadeiros responsáveis pelo desastre que aí está. Ele é fruto de decisões desatinadas do lulopetismo e da obsessão pela permanência no poder, com a ajuda da corrupção e de medidas populistas que nada têm a ver com desenvolvimento econômico e social ou com os interesses nacionais e populares.

ENTRADA NA "ZELITE"

Essa ironia de "O Antagonista" deve ter ferido fundo, muito fundo!, o boquirroto. Pior do que isto, acaba com a choradeira e o ódio contra a "zelite". Melhor do que este pior, é a engolida em seco que a Chauí deve estar deglutindo.

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Lula entra oficialmente na elite brasileira

Brasil 10.06.15 15:51 
Vamos repetir: com a descoberta de que recebeu 4,5 milhões de reais da Camargo Corrêa, Lula entra oficialmente na elite brasileira.

MAIS UM CAPÍTULO DE RETÓRICA VAZIA

O editorial do jornal Folha de São Paulo, de 10/06/2015,  mostra que o legado do legado, na verdade, é nova mistificação de retórica vazia, constantemente utilizada pelo petismo e pelo seu líder boquirroto e irresponsável. Já tivemos algumas edições do PACmania e os resultados nunca alcançaram sequer índices aceitáveis de realizações. No mesmo tom, se as obras previstas para a competição futebolística do ano passado ainda não foram pelo menos iniciadas, quanto mais concluídas, o quê se pode esperar da prestidigitação petista, no caso do último "pacote" anunciado? Não nos esqueçamos que as denominadas "obras da copa", eram anunciadas como padrão fifa (assim mesmo, com letras minúsculas, mesmo contrariando a regra dos acrônimos). 
Ora!, vê-se que falta planejamento e capacidade gerencial a esses novos membros das "zelites" e sobra muita, mas muita mesmo!, incapacidade governamental, arrogância e, acima de tudo, ignorância no seu sentido pleno.



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O legado do legado

No afã de gerar alguma notícia positiva, o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) não se importou em lançar o mais novo pacote bilionário de investimentos em infraestrutura bem na semana em que se completa um ano da abertura da Copa do Mundo no Brasil, evento que deixou um enorme rastro de obras inacabadas.
Conforme mostrou reportagem desta Folha no domingo (7), pelo menos 35 projetos de transporte coletivo e aeroportuários nas 12 cidades-sede ainda não ficaram prontos e apresentam as conhecidas mazelas de atrasos, estouro no orçamento, suspeitas de corrupção e erros de execução.
No caso do transporte público, setor que chegou a ser indicado como o maior beneficiário do legado da Copa, somente 21,4% das obras de grande porte do plano inicial foram inauguradas.
Um dos maiores descalabros é o VLT (trens leves sobre trilhos) de Cuiabá. Orçado inicialmente em R$ 700 milhões, o projeto tem agora seu custo estimado em R$ 2,5 bilhões e é alvo de uma CPI devido a indícios de desvio de recursos.
Como de praxe, o atraso tende a elevar os gastos com a empreitada. Pior, sem previsão para que o VLT entre em operação, os 40 trens comprados por R$ 500 milhões estão parados em um pátio e sofrem desgaste pela falta de uso.
Em São Paulo, a única obra de transporte público prevista no plano original, o monotrilho da linha 17-Ouro, ficou de fora do marco da Copa após a mudança dos jogos do Morumbi (zona oeste) para o Itaquerão (zona leste). Com isso, a construção entrou na rotina de atrasos do metrô paulista, e sua conclusão passou de 2013 para 2017.
Outra decepção são os aeroportos, com 12 promessas não cumpridas até agora. É o caso de Fortaleza, onde apenas 16% das obras do novo terminal foram realizadas.
Além de lentos, os trabalhos costumam ter erros de projeto e execução --às vezes resultando em tragédias. Em plena Copa, a alça sul do viaduto Batalha dos Guararapes, em Belo Horizonte, desabou.
Duas pessoas morreram e outras 23 ficaram feridas num episódio de resto previsível, segundo o inquérito, dado o "desprezo às normas mínimas de segurança".
O país sem dúvida precisa de vultosos investimentos em infraestrutura e logística, mas é no mínimo difícil acreditar em novos pacotes quando parece interminável a lista de projetos incompletos, que inclui não só o "legado da Copa" mas também a transposição do rio São Francisco, entre tantos outros.

CHEGA DE "SIFUDÊNCIA"

Gostei do texto de Daudt  uma vez que o conteúdo coincide com o meu sentimento, pois chega de sifudência, como o autor diz. Resta-nos, a mim e a todos, reagir ordenadamente influenciando o ambiente onde podemos agir, mesmo que seja apenas pelo esclarecimento dos fatos. Melhores resultados serão alcançados se pudermos lançar ideias como corolário da nossa raiva contida. Rui Barbosa está certo ao sugerir que a indignação faz parte da virtude.
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Raiva contida (Francisco Daudt, para o jornal Folha de São Paulo de 10/06/2015)

Sem indignação não se conserta o erro, não se pune o malfeitor, não se exila o tirano
Um psicanalista carioca escreveu que, se o Brasil fosse uma pessoa, ele lhe receitaria antidepressivos e exercícios físicos. Certo, o país anda abatido, mas ele estaria tratando apenas os efeitos da depressão, não suas causas.
O estado depressivo é um mecanismo de defesa que faz a pessoa se encolher diante de uma ameaça prolongada. Se fizermos uma engenharia reversa nele, veremos que sua causa imediata é o estresse. Este, apesar de popular, é mal compreendido. É fácil se dizer estressado. Não é tão fácil explicar o que é.
Estresse é a condição de se estar com uma angústia prolongada. Angústia vem do latim "angustus", apertado, o mesmo sentimento de aperto no peito que ela produz. Já os alemães são mais simples: "angst" significa medo. Aí temos a linha de montagem completa: medo; angústia; estresse; depressão.
Mas que medos são esses capazes de levar à depressão? Os medos prolongados possíveis são os de: ameaça física; abandono e solidão (perda do amor de pessoas queridas); desonra; sifudência (não carece de explicação); sentimento de culpa e raiva contida.
Cuidar da depressão é cuidar para que suas angústias de origem sejam resolvidas o mais possível. Como sempre, o primeiro passo é o diagnóstico: nosso paciente, o Brasil, sofre de três das angústias prolongadas acima, e logo aquelas últimas. Tememos ir para o brejo, fomos catequizados pelo governo, nós que ainda não estamos no brejo, a nos sentir culpados pela miséria alheia.
Por fim, temos a raiva contida: vivemos contendo nossa raiva impotente diante de predadores do nosso trabalho via impostos sem contrapartida, predadores do Estado para se eternizar no poder através da corrupção e da desconstrução da democracia, e, como se não bastasse, predadores do país por péssima gestão.
É só ver agora, quando foram chamar alguém competente --e de "direita"-- para consertar a, digamos, obra que o voluntarismo de Madame fez na economia. E o acerto de contas só atinge a quem trabalha: os 39 ministérios, os milhares de cargos de "confiança" que aparelham o governo e as estatais seguem intocados.
De vez em quando, o excesso de vapor acumulado pela raiva apita em panelaços e em manifestações de rua. Porém, como não resultam em grande coisa, a raiva volta a se acumular.
A raiva tem má fama, injustamente. "Os cristãos só devem ter amor no coração", diz o senso comum. Ainda bem que o fundador deles teve um ataque de raiva e expulsou os vendilhões do templo. Já imaginou a festa que ele faria no governo e no Congresso?
Uma vez que não podemos contar com um "deus ex maquina", resta-nos contar com nossa raiva. A raiva é a mãe da justiça: sem indignação não se conserta o erro, não se pune o malfeitor, não se exila o tirano. Rui Barbosa, o jurista, sabia disso: "Diante do escândalo, não somente não peca o que se irar, mas pecará não se irando". Ele era um homem de visão, parecia estar falando dos nossos dias, mas estava falando de todos os dias de sempre.
Nossa raiva, nossa capacidade de nos indignar, é um bem precioso para erguer, da Justiça, a clava forte!

O OUTRO DA MAGISTRATURA OPORTUNISTA

Sobre os recentes surtos de grandeza e de usurpação que o judiciário vem promovendo, vale a pena ler a manifestação desse juiz do Rio de Janeiro. Também vale a leitura da reportagem exposta logo depois do primeiro artigo, da jornalista Cláudia Wallin acerca de como pensam os Magistrados suecos sobre a atividade que desenvolvem e o modo de vida correspondente. 
Apenas isto!



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Tenho vergonha de ser juiz...!


Por João Batista Damasceno, juiz de Direito da 1ª Vara de Órfãos e Sucessões do Rio de Janeiro, doutor em Ciências Políticas e membro da Associação Juízes para a Democracia.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz. E não preciso dizê-lo. No fórum, o lugar que ocupo diz quem eu sou; fora dele seria exploração de prestígio. Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque não o sou. Apenas ocupo um cargo com este nome e busco desempenhar responsavelmente suas atribuições.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, pois podem me perguntar sobre bolso nas togas.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e demonstrar minha incompetência em melhorar o mundo no qual vivo, apesar de sempre ter batalhado pela justiça, de ter-me cercado de gente séria e de ter primado pela ética.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e ter que confessar minha incompetência na luta pela democracia e ter que testemunhar a derrocada dos valores republicanos, a ascensão do carreirismo e do patrimonialismo que confunde o público com o privado e se apropria do que deveria ser comum.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz e ter que responder porque - apesar de ter sempre lutado pela liberdade - o fascismo bate à nossa porta, desdenha do Direito, da cidadania e da justiça e encarcera e mata livremente.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque posso ser lembrado da ausência de sensatez nos julgamentos, da negligência com os direitos dos excluídos, na demasiada preocupação com os auxílios moradia, transporte, alimentação, aperfeiçoamento e educação, em prejuízo dos valores que poderiam reforçar os laços sociais.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque posso ser confrontado com a indiferença com os que clamam por justiça, com a falta de racionalidade que deveria orientar os julgamentos e com a vingança mesquinha e rasteira de quem usurpa a toga que veste sem merecimento.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque posso ser lembrado da passividade diante da injustiça, das desculpas para os descasos cotidianos, da falta de humanidade para reconhecer os erros que se cometem em nome da justiça e de todos os "floreios", sinônimos e figuras de linguagem para justificar atos abomináveis.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz porque faço parte de um Poder do Estado que nem sempre reconheço como aquele que trilha pelos caminhos que idealizei quando iniciei o estudo do Direito.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, porque tenho vergonha por ser fraco, por não conhecer os caminhos pelos quais poderia andar com meus companheiros para construir uma justiça substancial e não apenas formal.
Tenho vergonha de dizer que sou juiz, mas não perco a garra, não abandono minhas ilusões e nem me dobro ao cansaço. Não me aparto da justiça que se encontra no horizonte, ainda que ela se distancie de mim a cada passo que dou em sua direção, porque eu a amo e vibro ao vê-la em cada despertar dos meus concidadãos para a labuta diária e porque o caminhar em direção a ela é que me põe em movimento.
Acredito na humanidade e na sua capacidade de se reinventar, assim como na transitoriedade do triunfo da injustiça. Apesar de testemunhar o triunfo das nulidades, de ver prosperar a mediocridade, de ver crescer a iniquidade e de agigantaram-se os poderes nas mãos dos inescrupulosos, não desanimo da virtude, não rio da honra e não tenho vergonha de ser honesto.
Tenho vergonha de ser juiz em razão das minhas fraquezas diante da grandeza dos que atravancam o caminho da justiça que eu gostaria de ver plena.
Mas, eles passarão!
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João Batista Damasceno
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O que juízes escandinavos acham das mordomias que seus colegas no Brasil se autoconcedem.

por Claudia Wallin

Goran Lambertz, da Suprema Corte sueca: “Em minha opinião, é absolutamente inacreditável que juízes tenham o descaramento e a audácia de serem tão egocêntricos e egoístas a ponto de buscar benefícios como auxílio-alimentação e auxílio-escola para seus filhos. Nunca ouvi falar de nenhum outro país onde juízes tenham feito uso de sua posição a este nível para beneficiar a si próprios e enriquecer”


Ab ovo, desde o princípio dos tempos ditos civilizados, quid latine dictum sit altum sonatur, tudo que é dito em latim soa profundo nas egrégias Cortes da Justiça. Mas hic et nunc, neste instante, os linguistas mais perplexos com os atos de auto-caridade praticados pelo Judiciário do Brasil já estarão se perguntando, data venia, se não é chegada a hora de ampliar a definição do conceito de pornografia nos dicionários brasileiros.
In ambiguo, na dúvida, vejamos: em uma das maiores obscenidades já registradas em um mês das noivas, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro pediu e ganhou, em votação na Assembléia Legislativa em maio, uma bolsa-educação de até R$ 2,86 mil mensais a fim de bancar escolas e universidades particulares para filhos de juízes – que além de receberem salário de cerca de R$ 30 mil contam com vantagens como plano de saúde, auxílio-creche, auxílio-alimentação e carro com motorista à disposição.
Ao bacanal de maio seguiu-se o projeto do Supremo Tribunal Federal (STF) para a futura Lei Orgânica da Magistratura (Loman), que prevê auxílios para magistrados ab incunabulis, desde o berço até o caixão. Ganha uma toga quem adivinhar o resultado da votação do projeto pelos representantes do Congresso, a quem a dor dos vizinhos da praça dos poderes sempre parece incomodar.
O plano inclui o pagamento de até 17 salários por ano aos magistrados brasileiros, que deverão ter um leque admirável de benefícios extras e garantidos até o túmulo: até a conta do funeral dos juízes, conforme prevê a proposta do STF, será paga pelo erário.
Entre os vivos, encenou-se a devassidão de junho: os guardiões da lei do Rio Grande do Sul, que têm piso salarial de R$ 22 mil, acabam de se autoconceder um auxílio-alimentação de R$ 799 por mês.
Trata-se de um valor escandalosamente maior do que a maldita Bolsa Família (R$ 167,56 em média) dada aos pobres, que, segundo avançados estudos científicos conduzidos nos Jardins, não querem saber de aprender a pescar.
Como provavelmente não comeram nos últimos quatro anos, as excelências do Sul decidiram também que o pagamento do benefício deverá ser ex tunc, retroativo a 2011.
O indecoroso Bolsa Caviar contemplará todos os juízes, desembargadores, promotores e procuradores, assim como – suprema ironia – os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, responsáveis pela fiscalização do uso do dinheiro dos impostos do cidadão. Tudo devidamente encaixado na categoria de verba indenizatória, para ficar isento de imposto de renda: afinal, o dinheiro público parece ser res nullius, coisa de ninguém.
Exempli gratia, por exemplo, levantamento do jornal O Dia mostra agora que 90% dos juízes e desembargadores do Rio de Janeiro receberam vencimentos que chegam a estourar o teto permitido pela Constituição Federal. Em janeiro, o contra-cheque de um juiz chegou a registrar R$ 241 mil. Só em março, a folha de pagamento de juízes e desembargadores fluminenses totalizou o equivalente a 50.279 salários mínimos.
E seguramente sem animus abutendi, intenção de abusar, procurou-se também calibrar ainda mais os supersalários da magistratura brasileira juris et de jure, de direito e por direito, no ano passado: foi quando os conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público aprovaram o auxílio-moradia de até R$ 4.377 para todos os juízes, desembargadores, promotores e procuradores do Brasil – mesmo para quem já mora em imóvel próprio. Cálculos aproximados estimam que o impacto anual decorrente do benefício será de R$ 1 bilhão, nestes tempos dourados de PIB gordo e pleno emprego no País das Maravilhas.
Há que se registrar as notáveis exceções à promiscuidade, como por exemplo a postura do desembargador Siro Darlan de Oliveira – que, ao se posicionar de forma veementemente contrária ao auxílio-educação para filhos de juízes, foi afastado de suas funções pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Luiz Fernando de Carvalho.
Mas quis custodiet ipsos custodes? – quem afinal vigia os vigias?
O fundamental respeito de uma sociedade por seu Judiciário vai aos poucos, e perigosamente, sendo engavetado como um processo de Geraldo Brindeiro.
Nas mídias sociais, a frase de um internauta dá a medida do temerário grau de escárnio que cresce entre tantos indignados com as benesses das Cortes: “Quando é que vai aparecer uma operação Lava-Toga”?
Recomendam o bom senso e a razão o graviter facere nos tribunais – agir com prudência, moderação, gravidade.
Decido ad judicem dicere, falar com um juiz, aqui na Suécia. Telefono então para
Göran Lambertz, um dos 16 integrantes da Suprema Corte sueca, para contar as últimas novidades da corte brasileira. Lambertz é aquele juiz que pedala todos os dias até a estação central, e de lá toma um trem para o trabalho – e que me disse há tempos, em vídeo gravado para a TV Bandeirantes, que luxo pago com dinheiro do contribuinte é imoral.
Quando descrevo a nova lista de benefícios dos juízes brasileiros, Göran Lambertz dispensa totalmente, para meu espanto, a tradicional reserva e a discrição que caracteriza o povo sueco.
“Em minha opinião, é absolutamente inacreditável que juízes tenham o descaramento e a audácia de serem tão egocêntricos e egoístas a ponto de buscar benefícios como auxílio-alimentação e auxílio-escola para seus filhos. Nunca ouvi falar de nenhum outro país onde juízes tenham feito uso de sua posição a este nível para beneficiar a si próprios e enriquecer”, diz Lambertz.
Com o cuidado de avisar que não se trata de um trote, telefono em seguida para o sindicato dos juízes suecos, o Jusek, e peço para ouvir as considerações de um magistrado sindicalizado acerca da última série de benefícios auto-concedidos a si próprios pelos magistrados brasileiros — o Bolsa Moradia, o Bolsa Educação, o Bolsa Alimentação.
Sim, existe um sindicato dos magistrados na Suécia. É assim que os juízes suecos, assim como os trabalhadores de qualquer outra categoria, cuidam da negociação de seus reajustes salariais.
Meu telefonema é transferido então para o celular do juiz Carsten Helland, um dos representantes da categoria no sindicato.
Sinto um impulso incontrolável de dizer a ele que fique à vontade para recusar o colóquio e bater impiedosamente o telefone como bate seu martelo na Corte, pois os fatos que vai ouvir podem provocar sensações indesejáveis de regurgitação neste horário inconveniente que antecede o almoço do magistrado.
Mas, como que invadida pela cegueira da Justiça, decido narrar de vez ao juiz, sem clemência nem advertência, todos os obscenos benefícios pedidos e concedidos aos colegas brasileiros no além-mar.
Para minha surpresa, o magistrado sueco dedica os segundos iniciais da sua resposta a uma sessão de risos de incredulidade.
“Juízes não podem agir em nome dos próprios interesses, particularmente em tamanho grau, com tal ganância e egoísmo, e esperar que os cidadãos obedeçam à lei”, diz enfim o juiz, na sequência da risada que não pôde ou não quis evitar.
Recobrado o equilíbrio e a compostura que a toga exige, Carsten Helland continua:
“Um sistema de justiça deve ser justo”, ele começa, constatando o óbvio com a fala didática de quem tenta se comunicar com uma criatura verde de outro mundo.
“As Cortes de um país são o último posto avançado da garantia de justiça em uma sociedade, e por essa razão os magistrados devem ser fundamentalmente honestos e tratar os cidadãos com respeito. Se os juízes e tribunais não forem capazes de transmitir esta confiança e segurança básica aos cidadãos, os cidadãos não irão respeitar o Judiciário. E consequentemente, não irão respeitar a lei”, enfatiza o juiz sueco.
Pergunto a Carsten o que aconteceria na Suécia se os juízes, em um louco delírio, decidissem se auto-conceder benefícios como um auxílio-alimentação.
“Acho que perderíamos o nosso emprego”, ele diz, entre novo surto de risos. “Mas é simplesmente impossível que a aprovação de benefícios como auxílio-alimentação ou auxílio-moradia para magistrados aconteça por aqui”.
Por quê?
“Porque não temos esse tipo de sistema imoral. Temos um sistema democrático, que regulamenta o nível salarial da categoria dos magistrados, assim como dos políticos. E temos uma opinião pública que não aceitaria atos imorais como a concessão de benefícios para alimentar os juízes às custas do dinheiro público. Os juízes suecos não podem, portanto, sequer pensar em fazer coisas desse gênero”, conclui Carsten Helland.
O juiz Helland: “É simplesmente impossível que a aprovação de benefícios como auxílio-alimentação ou auxílio-moradia para magistrados aconteça por aqui. Não temos esse tipo de sistema imoral. Temos um sistema democrático, que regulamenta o nível salarial da categoria dos magistrados, assim como dos políticos. E temos uma opinião pública que não aceitaria atos imorais como a concessão de benefícios para alimentar os juízes à custa do dinheiro público”
O salário médio bruto de um juiz na Suécia é de cerca de 60 mil coroas suecas, o que equivale a aproximadamente 22,3 mil reais. O valor equivale ao salário de um deputado sueco, que em termos líquidos representa cerca de 50% a mais do que ganha um professor do ensino fundamental. O salário médio no país é de 27,3 mil coroas suecas.
“Há uma pequena variação nos salários dos magistrados suecos, que se situam em uma faixa entre 50 mil a 63 mil coroas suecas”, diz o juiz.
Há algum outro tipo de benefício além do salário?
“Não, absolutamente não” – ele responde.
A negociação anual dos reajustes salariais da magistratura se dá entre o sindicato Jusek e o Domstolsverket, a autoridade estatal responsável pela organização e o funcionamento do sistema de justiça sueco.
Para entender o sistema sueco, diz o juiz Helland, é preciso olhar um século para trás.
“A partir do final do século XIX, os sindicatos desempenharam um papel fundamental na construção da sociedade que temos hoje. Portanto, não é estranho ver magistrados ou qualquer outro profissional na Suécia sendo filiados a sindicatos. E é importante notar que ser membro de um sindicato, na Suécia, não significa que você seja de esquerda. Os sindicatos são parte essencial da base sobre a qual nossa sociedade foi consolidada – a dualidade entre trabalhadores e empregadores”, ele observa.
O reajuste salarial dos magistrados suecos trata normalmente, segundo o juiz, da reposição da perda inflacionária acumulada no período de um ano, e que se situa em geral entre 2% e 2,5%.
“Nossos reajustes seguem geralmente os índices aplicados às demais categorias de trabalhadores, que têm como base de cálculo os indicadores gerais da economia e parâmetros como o nível de aumento salarial dos trabalhadores do IF Metall (o poderoso sindicato dos metalúrgicos suecos)”, explica o juiz Carsten.
A negociação depende essencialmente do orçamento do Domstolsverket, que é determinado pelo Ministério das Finanças:
“Os juízes têm influência limitada no processo de negociação salarial”, diz Carsten. “As autoridades estatais do Domstolsverket recebem a verba repassada pelo governo, através do recolhimento dos impostos dos contribuintes, e isso representa o orçamento total que o governo quer gastar com as Cortes. A partir deste orçamento, o Domstolsverket se faz a pergunta: quanto podemos gastar com o reajuste salarial dos juízes?”, explica o juiz.
“Não podemos, portanto, lutar por salários muito maiores. Podemos apenas querer que seja possível ganhar mais”, acrescenta ele.
Greves de juízes não fazem parte da ordem do dia.
“Não fazemos greves, porque isso seria evidentemente perigoso para a sociedade”, diz Helland.
Já sei a resposta, de tanto fazer a mesma pergunta a jornalistas e a suecos em geral, mas resolvo perguntar mais uma vez: já ouviu falar de algum caso registrado de juiz corrupto na Suécia?
“Não”, diz Helland. “Nunca”.
Na Suprema Corte sueca, os reajustes salariais também seguem a mesma regra aplicada ao restante da magistratura.
O salário bruto dos juízes do Supremo, segundo Goran Lambertz, é de 100 mil coroas suecas (cerca de 37 mil reais). Uma vez descontados os impostos, os vencimentos de cada juiz totalizam, in totum, um valor líquido de 55 mil coroas suecas (aproximadamente 20,4 mil reais). Sem nenhum benefício ou penduricalho extra, e sem carros com motorista.
Neste exótico país, os juízes da Suprema Corte também não têm status de ministro, e nem são chamados de excelências.
“Se o sistema judiciário de um país não for capaz de obter o respeito dos cidadãos, toda a sociedade estará ameaçada. Haverá mais crimes, haverá cada vez maior ganância na sociedade, e cada vez menos confiança nas instituições do país. Juízes têm o dever, portanto, de preservar um alto padrão moral e agir como bons exemplos para a sociedade, e não agir em nome de seus próprios interesses”, diz Göran Lambertz ao final da nossa conversa.
Ou em bom latim, conforme rezam os manuais jurídicos: nemo iudex in causa sua – ninguém pode ser juiz em causa própria.

Sobre a Autora
A jornalista brasileira Claudia Wallin, radicada em Estocolmo, é autora do livro Um país sem excelências e mordomias.

"BABY BOOMER", COM ORGULHO!

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