Esperteza
eleitoral, claro!, por parte do governo. Burrice da sociedade produtiva que
aceita esse tipo de negócio estupidificante para 25% da população brasileira,
também esta responsável por aceitar a esmola.
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Por que o número de beneficiários do Bolsa Família
só cresce no Brasil
Em 2013, governo
destinou 20,6 bilhões de reais para bancar o benefício a 14,1 milhões famílias
– ou seja: um em cada quatro brasileiros
Há oito meses, boatos sobre o fim do
Bolsa Família causaram pânico e levaram milhares de pessoas a agências da Caixa
Econômica Federal em todo o país. Em meio ao episódio, duas cenas exibidas em
telejornais foram reproduzidas na internet por seu aspecto inusitado. Elas
mostravam beneficiárias do programa fazendo queixas incomuns. Francisca Flores,
de São Luís (MA), reclamava: “Só ganho 134 reais e não está dando nem para
comprar uma calça para minha filha, que tem 16 anos. Porque uma calça para uma
jovem de 16 anos (sic) é mais de 300 reais”. Diana dos Santos, de Fortaleza
(CE), contou diante das câmeras: “Eu fui à lotérica, como vou de costume, fazer
um depósito na poupança do meu esposo. Fui depositar o dinheiro. Como eu já
estava lá, aproveitei, levei o cartão, e tirei o Bolsa Família”.
Francisca acreditava que o dinheiro
do auxílio do governo deveria ser usado para bancar bens de consumo mais caros
do que os que o trabalhador médio pode bancar com seu salário. Diana revelou,
sem se incomodar, que sua família poupa dinheiro mensalmente – e quem faz
poupança evidentemente não está em situação de emergência financeira. É difícil
estimar a quantidade de beneficiários irregulares do Bolsa Família: mas os
exemplos de Francisca e Diana mostram que há algo de errado com o programa. Os
números de 2013 reforçam esta impressão.
No ano passado, o total de
beneficiários e o valor gasto com o programa atingiram novos recordes. Foram
20,6 bilhões de reais, pagos a 14,1 milhões de famílias. O próprio Ministério
do Desenvolvimento Social aponta que mais de 50 milhões de pessoas, ou seja,
mais de 25% da população brasileira, são atendidas pelo Bolsa Família. É o
equivalente à população da África do Sul.
Em 2004, as dimensões eram bem
menores: o total pago foi de 5,5 bilhões de reais, divididos por 6,6 milhões de
famílias. Para 2014, os números indicam que deve surgir um novo recorde: o
Orçamento previsto para o programa é de 25,2 bilhões de reais. Comparado com o
total do orçamento, o valor significa pouco mais de 1% dos gastos do governo. O
problema é a ampliação indefinida no programa. Não é exagero afirmar que,
mantida a curva de crescimento populacional do país e o aumento gradual dos
recursos para o programa, em menos de dez anos, metade dos brasileiros poderá
ser beneficada com o dinheiro do Bolsa Família. Um crescimento tão acelerado no
número de dependentes de auxílio governamental não aconteceu nem na parte da
Europa que mergulhou em uma grave crise econômica nos últimos anos.
A presidente Dilma Rousseff tem como
meta para 2014 incluir no programa outras 500.000 famílias – cerca de 1,8
milhão de pessoas – que teriam direito ao benefício mas estão fora do cadastro
dos programas sociais do governo. Fora isso, o crescimento vegetativo e as
oscilações da economia podem lançar no Bolsa Família novos beneficiários. É
fácil entrar no programa e difícil sair: mesmo que a família passe a receber
acima do limite de 140 reais mensais per capita, o corte no auxílio financeiro
não é automático. Se a renda per capita não ultrapassar meio salário mínimo
(362 reais), o cancelamento do benefício só é feito durante o período de
revisão cadastral, em outubro de cada ano.
O governo usa o Bolsa Família como
exemplo de uma medida bem sucedida. Mas como um programa criado para tirar
pessoas da pobreza pode ser elogiado se o número de dependentes aumenta a cada
ano? O crescimento vegetativo da população é uma explicação insuficiente, já
que a quantidade de beneficiários sobe muito mais rapidamente do que a de
brasileiros. “Se uma em cada quatro pessoas recebe Bolsa Família, isso quer
dizer que três em cada quatro pagam por uma quarta. Não me parece que a longo
prazo isso seja sustentável”, diz o economista Adolfo Sachsida, pesquisador do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O combate à pobreza é necessário, e o
Bolsa Família cumpre essa função. Mas a expansão indiscriminada no número de
atendidos pode não ser um simples lapso. Para o governo, há pouco a perder e
muito a ganhar com o crescimento descontrolado no número de assistidos pelo dinheiro
público: um programa relativamente barato, que tem pouca rejeição popular,
mantém dependente do Estado uma parcela cada vez maior dos cidadãos. Com a
devida propaganda, a lealdade desse eleitorado a cada quatro anos costuma ser
elevada.
Fiscalização
As falhas na fiscalização também ajudam a explicar o número cada vez maior de
beneficiários, apesar do crescimento da economia. Trabalhadores que possuem
empregos informais – segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), mais de 40 milhões de pessoas – por vezes acabam burlando as regras e
recebendo o benefício. “Não tem sido feito um controle adequado e isso
desvirtua o programa”, diz o professor Newton Marques, da Faculdade de Economia
da Universidade de Brasília (UnB).
Relatos de fraudes no programa não
são raros: algumas das irregularidades descobertas envolvem pagamentos em nome
de crianças, estrangeiros, mortos e até animais. As dificuldades na verificação
dos critérios facilitam os desvios. A fiscalização é feita no plano municipal,
com o uso de ferramentas oferecidas pelo governo federal.
Em um fórum virtual que reúne
gestores do Bolsa Família, os relatos sobre as dificuldades são frequentes. Em
uma das mensagens publicadas na página, um funcionário admite que não pretende
cancelar os pagamentos a uma beneficiária que, pelas regras, já ultrapassou a
renda exigida para participar do Bolsa Família: “Eu me sinto frustrado em ter
que fazer parte desse processo. Será por iniciativa minha que ela deixará de
receber o dinheiro que já está acostumada a receber. Sou eu quem irá explicar o
motivo de ela estar com o beneficio bloqueado. Enfim, serei eu quem irá escutar
as reclamações, ameaças e tudo mais”, diz ele.
O Bolsa Família contempla os núcleos
familiares com menos de 70 reais de renda per capita ou famílias que tenham
renda de até 140 reais per capita e possuam ao menos um jovem menor de 15 anos.
O menor auxílio pago aos beneficiários do programa é de 32 reais. De acordo com
a renda familiar e a quantidade de filhos, o valor pode subir muito: há
beneficiários que recebem 600, 700 e até 800 reais por mês. O valor médio pago
é de 120 reais.
Um dos problemas mais graves do Bolsa
Família é a falta das tão propaladas portas de saída. Oito em cada dez
atendidos pelo programa continuarão dependentes do benefício depois de cinco
anos. E não se pode dizer que os outros 20% superaram a pobreza necessariamente
graças ao auxílio do governo.
O efeito do programa também pode ser
uma das explicações para a baixa no índice de desemprego. A metodologia aplicada
pelo IBGE só considera desempregada a pessoa que, tendo mais de 15 anos,
procurou um emprego nos trinta dias anteriores à pesquisa e não encontrou. Com
o Bolsa Família garantido por tempo indeterminado, argumentam alguns
economistas, muitas pessoas não se dedicam com afinco à procura por um novo
trabalho. Como consequência, elas não são vistas estatisticamente como
desempregadas.
Adolfo Sachsida e Newton Marques
concordam que seria adequado instituir um limite temporal – três ou quatro
anos, sugere o pesquisador do Ipea – para que os beneficiários busquem uma
qualificação e adquiram uma fonte de renda por conta própria. Mas, dado o
potencial eleitoral do programa, nenhum partido político encampa uma proposta
do tipo.
Eleições
No período eleitoral de 2014, não haverá debates sobre o fim do Bolsa Família,
nem sobre a instituição de limites temporais ao programa. O candidato do
principal partido de oposição, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), já se vacinou
contra os potenciais boatos de que iria encerrar o programa: apresentou um
projeto de lei transformando o benefício em política de Estado.
“Não se pode falar disso durante a
eleição. E a principal razão é esta: 50 milhões de pessoas dependem do
programa”, diz o professor Paulo Kramer, do Instituto de Ciência Política da
Universidade de Brasília (UnB). Ele lembra que, em 1996, o governo americano
implementou uma reforma no sistema de assistência social para impor limites
temporais aos benefícios concedidos às famílias pobres. As mudanças
implementadas por Bill Clinton alteraram o modelo implementado três décadas
antes, no governo de Lyndon Johnson.
O desgaste do sistema anterior era
evidente: muitas pessoas em perfeitas condições de procurar trabalho deixaram
de fazê-lo para não perder os benefícios; o número de crianças nascidas fora do
casamento aumentou, já que os homens solteiros já não se sentiam obrigados a
assumir a responsabilidade financeira sobre as crianças; e os gastos federais
com a assistência social impediam o saneamento das contas públicas.
A regra aprovada em 1996, após um
esforço suprapartidário, instituía um prazo de dois anos para que o
beneficiário encontrasse um trabalho; depois disso, ele perderia direito ao
auxílio financeiro. Durante toda a vida, o cidadão poderia receber o benefício
por no máximo cinco anos. Também foram criados incentivos para a
responsabilidade individual dos assistidos. É bom lembrar: Bill Clinton
pertence ao Partido Democrata, mais à esquerda. Isso não impediu a reforma
moralizadora.
É razoável que o governo auxilie famílias
que, por razões diversas, estejam à beira da miséria. O debate gira em torno do
modelo aplicado: sem critérios rigorosos e apoio à autonomia dos mais pobres,
programas de assistência social podem causar efeitos negativos. É a lição que
os Estados Unidos aprenderam e que, aparentemente, o Brasil ainda precisa
aprender.
Fonte: Veja