A penúltima frase "mudar o SISTEMA que é bom, nem uma
palavra...", resume nosso problema. No caso brasileiro, o Sistema a ser
mudado deveria ser a modificação do pensamento nacional, aquele que, hoje,
sempre se define para soluções sequenciais de erros cometidos em função de
ações tomadas antes, que ocasionarão novas soluções sequenciais, numa geração
sem fim de normas e de leis, cuja representação poderia ser a CORNUCÓPIA, só
que, ao invés de riqueza, ela extravasa a fertilidade de problemas que mantêm a
Nação atrasada. Ainda neste contexto e comandando o atraso, temos a
Politicaria, a escola que forma politiqueiros, patrimonialistas e oportunistas,
sem a menor noção do que seja a verdadeira POLÍTICA. Esta, a POLÍTICA, é
feita de planejamento de longo prazo, de ideias possíveis de aceitação pelas
várias tendências nacionais, e de implantação das ações correspondentes, tendo
em vista a consolidação da cidadania e o bem-estar da população. Só que não!
Nossos parlamentares estão mais "para lamentar" suas poucas
atividades para a Nação e muitas iniciativas para os seus próprios
bolsos.
Enfim, uma
excelente concepção que gerou um excelente texto do autor.
_________________________
Um país intelectualmente
castrado
(Artigo de FERNÃO MESQUITA para O Estado de
S. Paulo de 30/7/2019)
Sexta-feira passada o Jornal
Nacional comemorou o “reconhecimento pela ONU” da “eficácia” da “campanha
antitabagismo” do Brasil. É “a maior redução de número de fumantes do mundo”. A
dúvida que remanesce é se isso se deve à ilustração dos brasileiros sobre os
malefícios do fumo ou ao imposto de 87%, saudado em tom de conquista, com que
Brasília gravou cada cigarro fumado no país, o que tornou impossível ao pobre
dar-se o luxo do vício nos legalizados e, como sempre, proporcionou ao governo
mais alguns bilhões para serem transformados em mordomias, salários, “ajudas” e
aposentadorias com correções anuais por “produtividade” para aquele punhado de
brasileiros “especiais” com quem ele gasta quase integralmente os 35% do PIB
(R$ 2,9 trilhões) que arranca ao favelão nacional todo ano.
Por acaso assisti essa notícia
na hora em que, pela internet, informava-me sobre o balanço parcial das leis e
alterações constitucionais que já preencheram os requisitos para subir às
cédulas da eleição de novembro de 2020 pedindo o veredicto dos eleitores
norte-americanos. O estado do Oregon, coincidentemente, vai votar uma emenda à
constituição local propondo um aumento do imposto sobre cigarros e dispositivos
eletrônicos de fumar, todo ele destinado ao sistema de saúde. A proposta veio
do governador que, para ser autorizado a submetê-la ao povo teve, antes, de
aprovar o pedido de licença com um quórum superior a 60% na Assembleia
Legislativa e no Senado estaduais.
O último estado americano a
votar a taxação de cigarros foi Montana, em 2018. A proposta foi recusada por
52,7% a 47,3%. Entre 2008 e 2018 os eleitores de nove estados votaram impostos
sobre cigarros naquele país onde por a mão no bolso dos contribuintes requer
uma corrida de obstáculos, o que explica porque o PIB de apenas um dos seus 50
estados – o de Nova York – equivale ao do Brasil e os dos outros 49 são
“lambuja”.
Até 25 de julho 22 propostas
de leis ou alterações constitucionais estaduais tinham-se qualificado para
subir às cédulas em 2020. Milhares de outras de alcance municipal ou menos que
municipal (vindas dos conselhos gestores de escolas públicas de cada bairro,
por exemplo) já estão nessa fila. Entre 2010 e 2020 uma média de 15 referendos
por estado apareceram nas cédulas nas eleições de anos pares. Esta do cigarro
do Oregon é um “referendo constitucional proposto pelo legislativo” (legislatively
referred constitutional amendment), um dispositivo usado em 49 estados. Mas
há também as “emendas constitucionais por iniciativa popular” (iniciated
constitucional amendment) que qualquer cidadão pode propor e qualificar
para submeter ao eleitorado colhendo um determinado número de assinaturas.
Existem ainda os “referendos automáticos” (automatic ballot referral),
quando os legislativos, obrigados por leis de iniciativa popular anteriores,
têm de submeter ao povo qualquer lei abordando determinados temas (alterações
de impostos, notadamente, entre outros à escolha de cada comunidade).
Já os bond issues,
muito comuns no país todo, acompanham obras públicas e gastos fora do
orçamento. De escolas para cima, melhoramentos e obras envolvendo emissão de
dívida têm de ser aprovados no voto pelas comunidades que vão usar o bem e
pagar por ele.
Sobem às cédulas para voto
direto do povo até mesmo as “advisory questions” que qualquer um pode
propor para acabar com aquelas “verdades estabelecidas” que em países como o
Brasil bastam para sustentar legislações inteiras e privilégios mil só no papo
furado. Pergunta-se diretamente ao eleitor se concorda ou não com aquela
“verdade” (a “impopularidade” da reforma da previdência ou da reforma trabalhista,
por exemplo). O resultado não vira lei mas serve para “orientar” legisladores
que são, todos eles, sujeitos a recall.
Desde que o direito de
referendo foi adotado pelo primeiro estado, em 1906, 521 subiram às cédulas de
23 estados e 340 leis estaduais (65,3% das desafiadas) foram anuladas pelo
povo. Milhares de outras tiveram o mesmo destino no nível municipal. Mesmo
assim é bem pouco, o que prova que dispor da arma induz automaticamente os
representantes eleitos ao bom comportamento, tornando desnecessário usá-la a
toda hora.
Já o recall é
bem mais “popular”. Até 27 de junho 72 processos atingindo 115 políticos e
funcionários públicos tinham sido abertos em 2019. Os recall são
frequentemente decididos em “eleições especiais” convocadas só para isso. 37%
dos disparados em 2019 ainda dependem de qualificação, 11% já têm votação
marcada, 15% já foram votados e aprovados e 10% foram votados e recusados. 41
vereadores, 28 membros de conselhos de gestão de escolas públicas e 22
prefeitos estiveram entre os alvos.
Foi desse ponto que voltei,
naquela sexta-feira, para o eterno “Como resolver nossos problemas sem
remover suas causas”, “como sobreviver à nossa doença sem curá-la”
dos doutos luminares que falam e agem pelos brasileiros. Este jornal, invocando
o FMI, torcia para que a montanha cuspa o camundongozinho de sempre para
“voltarmos a um crescimento de 2,2% podendo chegar a 3% se e somente se dobrar
a taxa de investimento de hoje” (o que é totalmente impossível, recordo eu,
mantidos os “direitos adquiridos” dos brasileiros “especiais”). Na outra
ponta The Intercept Brasil e suas estações repetidoras,
a Folha de S. Paulo e a Veja, batalhavam a
volta ao rumo da venezuelização começando pela libertação dos bandidos e a
prisão dos mocinhos, a bandeira que a vice-presidenta da chapa que disputou com
Bolsonaro pelo PT trouxe do outro lado da lei e tenta plantar no centro do
debate nacional. E entre os dois, mais do mesmo em dosagens variadas.
Como último recurso saltei
para a internet, mas em vão. Ali o mais longe que vai o futuro do Brasil é onde
pode levar-nos a revolucionária discussão sobre quem a polícia (que se pôs fora
da reforma da previdência quase pela força das armas) deve ou não deve prender.
Mudar o “Sistema” que é bom, nem uma palavra…
O Brasil é um país
intelectualmente castrado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário