É isso! Ou não é?
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-Comandante, ainda bem que você veio. Ontem me
disseram que você não queria mais dar a entrevista.
- É, mas pensei
melhor. Se eu prometi, está prometido. Alguém tem que manter a palavra neste
país. Mas isso não impede, sem querer ofender ninguém, que eu ache esta
entrevista uma palhaçada.
- Não entendi.
- Não vai sair nada do
que eu disser, a imprensa está toda no bolso do governo, devendo à Previdência
e à Receita e mamando as verbas de publicidade. A imprensa está aí para ajudar
no fingimento de que há liberdade, vontade popular, opinião pública e essas
besteiras feitas para declamação. Isto mesmo que eu acabo de dizer quero ver
sair, não sai. Está gravando?
- Estou.
- Você está perdendo
seu tempo, não vai sair nada. Grave aí que eu acho que essa democracia é para
as negas deles, o que eles fazem é entrolhar todo mundo e fazer tudo da veneta
deles. Você viu a do ensino? Agora é obrigatório botar o filho na escola aos 4
anos! A quem que eles perguntaram? Eles não conseguem dar conta nem de metade
dos que já têm direito e inventam mais? Estamos cheios de grandes escolas
públicas para todos, todo mundo na escola de barriga cheia desde os 4 anos, que
beleza! Eu não sou otário, eu não sou otário! Eu queria que eles compreendessem
que eu não sou otário!
- Eu pretendia chegar
a assuntos como esse, sei que você tem opiniões muito firmes. Mas minha
primeira pergunta ia ser outra, mais pessoal.
- Ah, desculpe, eu às
vezes me exalto um pouco. Pode perguntar o que você quiser. Se eu contar coisas
pessoais, também não sai, eu não sou pervertido, a imprensa só se interessa
quando é a vida pessoal dos pervertidos. Não vai sair nada, mas eu respondo a
qualquer pergunta.
- Bem, a pergunta é
uma curiosidade minha. Frequentamos este mesmo boteco há não sei quantos anos e
nunca vi você chegar dando risada sozinho, como vi hoje, na hora em que você
estava descendo da sua famosa bicicleta elétrica. Dá para dizer qual foi a
razão?
- Dá, eu não escondo
nada. Não era riso de satisfação, nem de felicidade. Era uma risada mórbida que
deu para me atacar de uns tempos para cá, uma espécie de humor negro. Eu estava
me lembrando de um comercial. Não sei do que era, só me lembro da cena. Era um
casal fazendo um piquenique romântico na Lagoa à noite, sentadinho com um pano
de mesa estendido, luz de velas, cestinha de comida, parecia uma aquarela
campestre. Aí eu fiquei pensando e me deu uma crise desse riso mórbido. E, na
hora de minha chegada, não sei por que, me lembrei de novo. Sempre que eu
lembro, rio novamente, é incoercível. Piquenique na Lagoa é demais, não é, não?
- Demais como?
- Você não entendeu?
Piquenique na Lagoa, piquenique na Lagoa! Só pode ser Walt Disney, e dos anos
50! Quando o casal tivesse acabado de estender a toalha, já não ia ter mais
cestinha, nem garrafinha, nem vela, nem piquenique nenhum! Seja sincero e
realista e me responda quantos segundos você daria para um casal começar um
piquenique à noite na Lagoa e o piquenique ser todo comido e possivelmente o
casal também. Dou 90 segundos, mas ganha quem der um minuto. Aí eu fico
pensando no que poderia acontecer a esse casal e o piquenique deles e tenho
essas crises de riso, é tudo humor negro mesmo. Uns dois dimenores liquidavam
tudo numa boa.
- Você tem uma birra
com os menores, não tem?
- Eu não, eu só sou
contra o que eu vou lhe figurar. Eu sou João Narigolé, traficante que de vez em
quando precisa de outros serviços, notadamente os que envolvem dar cabo de
alguém. Aí, quem é que eu chamo para fazer o serviço? Vou ao banco de dados de
menores pistoleiros… Deve haver vários bancos de dados desse tipo, é capaz até
de já ter no Facebook. Vou lá, escolho um, ofereço uma graninha e ele faz a
execução. Se for preso, não pega nada e recebe a grana pelo serviço. Se me
dedurar, sabe que eu posso mandar outro dimenor para rechear de azeitonas a
cabeça dele e assim por diante, é um esquema perfeito. O dimenor é um grande
patrimônio da criminalidade nacional.
- Então você é a favor
da diminuição da maioridade penal.
- Eu não! Não distorça
minhas palavras! A favor da diminuição geral, não, cada caso é um caso! Eu só
tenho propostas sérias e eficazes, esse negócio de fixar idades com base em
invencionices psicológicas não resolve nada. Eu sou a favor de uma coisa muito
simples: teve idade para apontar a arma e dar o tiro, tem idade para ir em
cana. Não é simples? É a coisa mais óbvia para qualquer um e somente os
intelectuais é que não concordam, porque as soluções simples dão desemprego
para eles, tudo aqui é em função do emprego.
- Você não acha que a
responsabilidade penal do menor…
- Ninguém mais é
responsável por nada! Isso era antigamente, agora todo mundo é vítima e
qualquer sacanagem que apronte recebe um nome artístico, dado pelos
psiquiatras! Um nome artístico e uma bolinha e está tudo resolvido, a culpa não
é de ninguém, é da síndrome! A culpa não é dele, é das condições
socioeconômicas! A culpa não é dela, é dos traumas de infância! Ninguém tem
mais culpa de nada, ninguém fica preso, ninguém paga do próprio bolso as multas
às empresas, ninguém é responsável por nenhum desastre, todo mundo rouba e
mata, há muito tempo que isto é uma esculhambação! O que nós precisamos é de Robespierre!
Nada de faxina! Para quem propina, rapina e assassina, o correto é guilhotina!
Quero ver isso sair no jornal!
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