DEVERÍAMOS VER O RETORNO DA VERGONHA NA CARA

Inspirador o texto abaixo, pois mostra que ainda há esperança para a Humanidade, embora a vergonha na cara e os escrúpulos ainda estejam muito longe dos brasileiros. Mas, ocorrendo em alguma parte do mundo já é alguma coisa e talvez algum dia chegue por aqui. Só que nossa geração e mais duas outras talvez, não verão essas transformações. Afinal, todo o desenvolvimento que vínhamos conseguindo nas últimas décadas antes do lullopetismo, afundou nos descaminhos morais dos recentes 14 anos. A técnica de destruição usada pela ORCRIM foi meticulosa e extremamente eficiente e o reordenamento institucional e da sociedade necessitarão de um esforço gigantesco do povo brasileiro para voltar aos níveis de antes e retomar a reconstrução socioeconômica e moral da Nação. 
Recomendo a leitura do texto abaixo, pois o escriba foi muito feliz em unir os vários pontos do pensamento.



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O mínimo de vergonha na cara

Com espanto, leio que a advocacia japonesa enfrenta uma crise por falta de problemas jurídicos. Repito: falta de problemas jurídicos. Muitos advogados japoneses estão vivendo na pobreza. Há poucos meses, li também que o ministro da Economia do Japão, Akira Amari, renunciou e depois pediu perdão por ter recebido dinheiro e presentes de uma empresa de construção em troca de favores. Fenômeno assemelhado, embora mais trágico, aconteceu há dez anos, quando o ministro da Agricultura japonês suicidou-se depois de se envolver em um escândalo de corrupção. Leio isso e não posso deixar de pensar como o Brasil é um país atrasado. Como se chegou até aqui? Uma crença pessoal: o problema do Brasil, e do mundo subdesenvolvido de modo geral, é a falta de vergonha na cara.
Só há decência real em países onde as autoridades – e também a sociedade – têm o mínimo de vergonha na cara. Uma sociedade civilizada não aceita a incompetência das autoridades, seus crimes e escândalos. E pune como pode os comportamentos desviantes desses infelizes no poder. Numa sociedade civilizada, o lugar dessa gente é a irrelevância, o ostracismo ou coisa pior. Isso é tão evidente que me espanta como ninguém, até agora, tenha falado daquele que é o maior problema no país: o mínimo de vergonha na cara, principalmente das autoridades. Note bem, eu disse o mínimo; o mínimo de vergonha na cara já nos tiraria do buraco onde fomos jogados.
Ninguém com o mínimo de vergonha na cara gostaria de ver seu nome ligado ao maior escândalo de corrupção do país, por exemplo. E ficaria tão constrangido de ver sua foto nas capas dos jornais, ilustrando matérias sobre os milhões recebidos em propinas, que renunciaria ao cargo público no primeiro momento. Uma autoridade com o mínimo de vergonha na cara não seria capaz de desviar dinheiro de obras de escolas ou de merenda escolar e seria mais propenso a renunciar, desaparecer ou cometer um harakiri, que seja, caso seus crimes fossem descobertos. O sujeito com o mínimo de vergonha na cara é melhor cidadão, pai, síndico ou presidente. Ele não comete extorsão, falsidade ideológica ou improbidade administrativa. E mesmo quando comete, assim que se levanta a suspeita dos crimes, ele renuncia, pede perdão para a sociedade e é condenado ao ostracismo.
Os governantes ineptos e corruptos só estão no poder porque parte da sociedade os tolera. Já disse antes: não existe nada mais patético do que ver artistas, intelectuais e afins defendendo uma autoridade incompetente que jogou o país na pior recessão da história. O resultado nefasto disso está na permanência de outras autoridades tão ou mais incompetentes. É um ciclo vicioso. Renunciar à presidência da Câmara para que, se nem a maior autoridade, que jogou o país no buraco, tem o mínimo de vergonha na cara para fazer o mesmo? Tenho certeza de que um país onde as autoridades têm o mínimo de vergonha na cara seria infinitamente melhor do que esse que vemos pela janela. Mas se a sociedade, nesses tempos sombrios, ainda se agarra a uma autoridade incompetente, corrupta e criminosa, esqueça: não sairemos do buraco tão cedo.
Isso resolveria todos os problemas? É claro que não. Mas em doses mínimas, a vergonha na cara seria um primeiro passo para não repetirmos o mal. O mínimo de vergonha na cara esvaziaria o ego inflado das autoridades como um estilete furaria o pato da FIESP. O mínimo de vergonha na cara não serviria apenas para superar a crise e nos tirar do buraco. Seria uma vitória para o futuro, para o país que queremos no futuro: um país que, depois de passar pela pior recessão da história, pelo maior escândalo de corrupção de que se tem notícia, entendesse que a única forma de garantir o mínimo de dignidade na vida passa por não tolerar a incompetência, a corrupção e os crimes desses infelizes no poder.

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O CONTEXTO DO TEMPO E NÓS

O tempo, ah, o tempo! Nada somos no contexto do tempo e nada deixaremos a não ser lembranças, também estas, morredouras. ___________________...