O LADO HUMANO DA JUSTIÇA


A entrevista abaixo, com o ex-Ministro do STF, está publicada no jornal Zero Hora, de hoje. É interessante notar a lucidez e a bonomia da fala de Brito, próprias de um pensador da vida, cujos fundamentos certamente vêm dos momentos meditativos que pratica diariamente. Em meio ao tom extremamente humilde é possível perceber uma mente profissional e convicta dos caminhos da Justiça, assim como foram seus votos, pelo menos no processo do MENSALÃO.
Boa leitura!

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Entrevista com o ministro, jornal Zero Hora

Ayres Britto fala sobre mensalão: "Nunca se viu conjunto de crimes tão graves"

Ex-presidente do STF, que estreia neste domingo como articulista de ZH, expõe suas opiniões

Carolina Bahia e Klécio Santos


Carlos Augusto Ayres Britto de Freitas, 70 anos, ainda está longe de se aposentar. Na primeira insinuação de que a vida estaria mais tranquila afastado dos conflitos do Supremo Tribunal Federal, responde com a voz serena, mas marcada pelo forte sotaque sergipano:
— Continuo no batidão de sempre.
Uma semana depois de deixar a presidência da mais alta Corte do país, o magistrado vem atendendo a numerosos compromissos para conferências e homenagens em diferentes lugares do Brasil. Nada, porém, denota qualquer estresse no tom cordial de Ayres. Parece se divertir depois de três meses de grande tensão à frente do rumoroso julgamento do mensalão. O local da entrevista foi uma escolha pessoal do ex-ministro, o Ernesto Cafés, um ambiente aconchegante que costuma frequentar aos domingos e conhece os funcionários pelo nome.
— Boa tarde, Aninha. Tudo bem com você? Um café com leite — pede o ministro à garçonete, que vez por outra ainda serve uma tapioca doce para o ilustre frequentador.
Entre máquinas de torrefação e cafés aromáticos, Ayres começa a filosofar na tarde nublada da última quarta-feira em Brasília, distante do Supremo, que naquele dia decidia as penas do delator Roberto Jefferson e do deputado João Paulo Cunha. Ao longo de quase duas horas de entrevista, cria neologismos como insimilar e cita desde gurus indianos como Jiddu Krishanamurti e Osho [Rajneesh] até o dramaturgo inglês William Shakespeare, fala de pequenos prazeres como tocar violão e dos preparativos para o lançamento de seu sétimo livro de poesia, DNAlma, projeto que havia abandonado por não achar conveniente lançá-lo em meio ao julgamento do mensalão por conta de liberdades que concede enquanto escreve.
- Escrevo como quem respira e a publicação naquele momento me traria problemas — reconhece.
Afinal, o livro contém poemas curtos, tipo haicai com pérolas como: "o que certos políticos sabem cerzir, são as meias verdades".
Ayres faz questão de frisar que um dos prefaciadores é o poeta gaúcho Carlos Nejar e que irá dedicar a obra a vários escritores, entre eles Fabrício Carpinejar, a quem lamenta não conhecer, mas admira a ponto de citar oxímoros de cor. Durante a conversa, Ayres carrega o entusiasmo do menino que um dia sonhou em ser jogador de futebol. Ele mesmo confessa que era um craque, fazia 400 embaixadinhas e dominava a bola com os dois pés. Mas o pai, um poeta e juiz observador, preconizou:
- O seu negócio é filosofia, meu filho. Você é um homem das letras!
No próximo domingo, Ayres estreia como articulista de Zero Hora e os leitores poderão desfrutar dessa vocação. A seguir, os principais trechos da entrevista:
ZH - Como é a vida sem a toga? A toga pela responsabilidade pesava?
Ayres - Não pesava. Eu sempre soube fazer do meu dever um prazer sem querer dourar a pílula. Sempre coloquei no que fiz, e continuo a colocar no que faço, alegria, empenho, responsabilidade, de modo a fazer do meu trabalho a minha própria cara. Você termina se transfundindo, transferindo sua subjetividade para objetividade do seu trabalho.
ZH — Com a saída do STF, o senhor teria dito que vai se dedicar à reforma da casa e a terminar um livro de poesias. Quais os seus planos a curto prazo?
Ayres - Não sou de fazer planos, mas, a partir de uma análise daquilo que gosto de fazer tudo em mim é previsível. Continuarei voltado para leituras, conferências e criação artística na área da poesia e jurídica. E a reforma da casa estou envolvido até o pescoço. O livro de poesias estava pronto, eu não publiquei porque não queria abrir flancos, dar ensejo a discussões certamente desgastantes no que tocam as licenças poéticas. O criador não se censura, ele não agrada ao politicamente correto. Quem escreve poesia muitas vezes não mede as palavras, não usa trena nem esquadro, é mais solto. Esse tipo de postura literária, concomitante à presidência do Supremo me traria problemas. Me tiraria do foco.
ZH - O senhor comentou durante o julgamento que condenar alguém deixa na boca um gosto de jiló.
Ayres - Eu gosto de tocar violão, hoje estava tocando uma música de Gonzaguinha: Primeiro você me azucrina, me entorna a cabeça e deixa na boca um gosto amargo de fel. Ai eu pensei: poxa, devia ter citado Gonzaguinha.
ZH — Esse gosto já passou?
Ayres - Sim. Um juiz criminal tem que julgar com o máximo de cuidado para não se sentir culpado ao culpar. Para ter que culpar o réu, você tem que ter a certeza de que não vai se culpar como julgador. No começo, ou até a metade do julgamento, o meu sono estava mais fatiado do que a metodologia usada por Joaquim Barbosa para o julgamento. E creio que isso acontecia com os demais ministros. Por isso falei sobre gosto de jiló, mandioca brava e berinjela crua. Você fica se questionando o tempo todo. Quando o caso é de condenação, tem que condenar. Você condena contristadoramente, amargamente, principalmente se a condenação for para aplicar a pena privativa de liberdade.
ZH — Como o senhor vê alguns comentários de que há exagero nas penas?
Ayres — Primeiro, o Supremo fixou uma pena a partir do voto do relator, que na maioria das vezes preponderou sobre o voto do revisor. Se convencionou para segundo momento alguns ajustes, para que o princípio da proporcionalidade você observado ao máximo. Alguns ajustes ainda virão, sobretudo por efeito da distinção entre crime continuado e concurso material de crimes. Isso tudo ficou ajustado, é possível, portanto, que mais adiante haja uma pequena redução nas penas.
ZH - Como os senhor vê as manifestações de condenados com relação ao Supremo? É um amadurecimento da democracia ou uma afronta ao Supremo?
Ayres - Vejo a irresignação dos réus como uma reação natural de quem vê o processo pelo prisma do personalíssimo, que diz respeito aos interesses deles. Essa irresignação fica no princípio da liberdade de pensamento e expressão. Nada a censurar. Agora, a minha convicção é de que o Supremo foi serviente do direito positivo brasileiro ao emitir os dois juízos centrais, o primeiro de condenação e o segundo de apenação, fazendo com transparência, responsabilidade, cuidado técnico e isenção, ingredientes que legitimam a decisão.
ZH - É difícil não ceder a pressão da opinião pública num julgamento como esse?
Ayres - Eu tenho para mim que o Supremo fez mais à opinião pública do que foi influenciado por ela. Não vamos inverter as coisas. A medida que o processo ia transcorrendo e os debates entre os ministros do Supremo se travando, a opinião pública foi se formando. Mas não é só: um ministro do Supremo é vacinado contra qualquer tipo de pressão.
ZH — Mas de certa forma, o julgamento surpreendeu o cidadão, que não esperava ver grandes políticos condenados. Fica um novo padrão para nossa política?
Ayres - Eu sou de formação holista, tendo a ver as coisas por um prisma esférico. Em uma circunferência estão todos os lados. Quando você vê a realidade, inclusive jurídica, esfericamente, você a vê por todos os ângulos. O que tem sucedido o Supremo na última década? É só você pensar: combate ao nepotismo, células-troncos, Lei Maria da Penha, liberdade de imprensa, homoafetividade, lei da Ficha Limpa, fidelidade partidária, Marcha da Maconha. O Supremo vem com histórico de decisões que influenciam o modo de agir e pensar dos brasileiros, está mudando a cultura brasileira para mais próxima da democracia, do não preconceito e do civismo.
ZH - O senhor tem religião, acredita em Deus?
Ayres - Acredito em Deus, sou deísta, sou criacionista. Agora sou de formação católica, mas eu me defino hoje como holista ou espiritualista. Transito em todas as religiões mas não fecho com nenhuma.
ZH - Como é transitar em todas as religiões?
Ayres - Religião significa pelo etmo da palavra religação. Que religação? Da criatura com o criador. As religiões fazem o meio-campo, a ponte entre o crente e a divindade. A minha opinião hoje é de que o ideal é uma linha direta do crente com a divindade, sem passar pela mediação das igrejas, das confissões. É como você olhar o brilho e a silhueta da lua através de um lago pela lâmina d'água. Não é melhor olhar direto?
ZH - O senhor aprendeu isso com a meditação?
Ayres - A meditação é realmente uma fascinante escola de vida. Para você conhecer a sua personalidade, o mistério da vida, é preciso meditar. Tenho feito diariamente, medito há pelo menos 20 anos. Meditação budica ou oriental. Com o tempo, cada meditante se torna professor de si mesmo.
ZH - E a tensão entre relator e revisor existia nos bastidores?
Ayres - Em algumas poucas oportunidades, sim. Houve tensão nos bastidores. Mas a minha opinião final sobre os ministros é favorável. Acho que no limite, um ministro do Supremo, é plenamente consciente de que o senso de institucionalidade deve preponderar sobre o senso de vaidade, egocentrismo ou coisa que o valha.
ZH — São as vaidades que fazem com que os ministros briguem entre si?
Ayres - Eu não diria as vaidades, eu diria o pluralismo, a diversidade, que é própria da vida e do ser humano. Há um contraditório argumentativo entre os juízes de um mesmo colegiado. E mais do que saudável, é necessário para legitimar a decisão. Como presidente eu busquei criar o maior clima possível de liberdade para que a discussões aflorassem.
ZH - As transmissões do julgamento pela TV proporcionam um certo espetáculo?
Ayres - Sou favorável a visibilidade do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. A exposição em excesso só influencia julgadores imaturos. Os julgadores amadurecidos nas lides forenses e judiciária tiram de letra. Eu mesmo nem percebo que estou sendo filmado, você se habitua.
ZH - Mas depois do mensalão o senhor acha que o Supremo pode recuar sobre a transmissão das sessões na TV?
Ayres - Acho que não. Vamos ter vantagens e desvantagens. Desvantagens: O ministro se sente, digamos, protagonista social mais do que judicial. Ele se sente alvo das atenções de todo o país, com o risco de propender ou resvalar para o estrelismo, o vedetismo, o marketing pessoal, a chance de sentir um pop star, reconhecido nas ruas, com foto nos jornais, imagem no noticiário. É o que de pior pode acontecer você se sentir uma estrela. Isso acontece se você for imaturo. E ali não tem ninguém imaturo. Dá para administrar a exposição sem se deixar afetar por ela.
ZH — E as vantagens?
Ayres - Você requinta o voto. Ninguém quer passar recibo de decadente, de leviano, de comparativamente fraco no contexto dos outros ministros. Ali todo mundo tem que transformar os pré-requisitos de investiduras em requisitos de desempenho. A tendência de um ministro do Supremo é dizer, "eu tenho uma obrigação". E para isso, tenho que ser preparado tecnicamente o tempo todo e castamente ético.
ZH - Ao mesmo tempo, o juiz deixou de ser inalcançável, a população se aproximou de vocês.
Ayres - É isso que eu estou dizendo, a vantagem. Sem firulas, sem floreios, sem rapapés para dizer o que o Joaquim Barbosa disse [na posse]. Você exercita ali, a vista de todos, a sua capacidade de diálogo, a sua humildade para ouvir o outro. Você tem de saber ouvir o outro, porque o voto não é uma decisão. É interessante, pois um juiz de primeiro grau pode mais do que um ministro do Supremo no seguinte aspecto: a sua sentença exprimi a vontade decisória do Estado. O voto do ministro do Supremo não é uma decisão, é uma proposta de decisão. Você não quer vencer, você quer convencer. Você tem de ser convincente.
ZH - O senhor falou que honrar a indicação é ser independente.
Ayres - O melhor modo de honrar o nomeante é você ser independente, honesto, corajoso. Do ângulo do juiz, essa cobertura da imprensa obriga você se comportar em público sem pagar mico. Isso é excelente, você toma cuidados para que suas virtudes aflorem e seus defeitos fiquem submersos. Agora, do ângulo do cidadão, ele começa a internalizar a ideia jurídica de que é direito dele saber como julgam os magistrados. É um direito do cidadão ver a decisão sendo formada passo a passo, momento a momento. E o cidadão vai se habituando a cobrar coerência do julgador. A maior de todas as coragens para o Judiciário e a coragem de assumir a sua independência.
ZH — Qual a sua opinião sobre a perda automática do mandato dos parlamentares condenados?
Ayres — Talvez seja a única pergunta que eu vou deixar sem resposta. Por quê? Porque foi o único voto que eu não preparei.
ZH - Como o senhor vê essas críticas de que o José Dirceu foi condenado sem provas e de que a corte teria usado apenas indícios?
Ayres - É um direito de todo o réu porfiar, persistir na sua defesa. A Constituição assegura a todo o réu a intransigente defesa própria ou a não autoincriminação. Isso incorpora o direito de se insubmeter às decisões no plano argumentativo. Agora, quando dizem que o Supremo inovou ou produziu julgamento heterodoxo, eu digo que não, absolutamente não. Heterodoxa é a causa.
ZH — Por quê?
Ayres - Nunca se viu no ponto de largada de uma ação penal, 40 réus pertencentes as mais altas esferas da sociedades: governamental, política, empresarial, bancária. Nunca se viu um conjunto de crimes tão graves, tão numerosos e entrelaçados. Corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, gestão fraudulenta, você nunca viu isso. Então, insimilar é o caso com quase 60 mil páginas, 600 testemunhas. E o Supremo teria de tomar uma decisão afeiçoada a heterodoxia do caso, e o fez tecnicamente, com toda isenção e transparência.
ZH - O senhor foi filiado ao PT nos seus áureos tempos. Na sua opinião, o que fez com que o partido perdesse o que ele mais pregava?
Ayres - Eu faço uma distinção. Não é o PT que está sendo julgado, porque os réus são dirigentes altivos do PT. E o PT, mais até do qualquer outro partido, pratica um pluralismo de tendências, de visões internas, que me obriga a fazer essa distinção. No PT há quadros, personalidades que eu tenho como dignas de toda admiração, de todo respeito, a partir do governador do Rio Grande do Sul, o Tarso Genro. Agora, se você quiser uma opinião um pouco mais sociológica, eu diria que aconteceu com o PT o que aconteceu com o PSDB. Esses dois partidos encarnavam o espírito de resistência chegaram ao poder máximo. PSDB com Fernando Henrique, PT com Lula. Observou-se no governo do PSDB um certo recuo ideológico, uma espécie de arrefecimento ideologicamente falando. O ímpeto transformador dos nossos costumes políticos foi sensivelmente reduzido. E o mesmo fenômeno aconteceu com o PT. Do ponto de vista social, o Brasil melhorou, tanto no governo do PSDB quanto no do PT. Mas a qualidade da vida política do nosso país, não. Os dois falharam nisso.
ZH — Há um movimento na internet que defende Joaquim Barbosa para presidente da República. Qual a sua opinião?
Ayres - Faz parte da excitação cívica incomum em nosso país, ao perceber que um princípio fundamental de estruturação das sociedades civilizadas está sendo aplicado pelo Supremo. Que princípio? De que a lei é igual para todos, de que ninguém está acima da lei. Como o ministro Joaquim ganhou mais projeção pelo fato de ser o relator, ele, passa a ser visto como salvador da pátria. Mas é apenas um momento, uma euforia que logo refluirá, porque o ministro não tem a menor pretensão de ser presidente da República.
ZH - O senhor é a favor de que os ministros tenham mandatos, como políticos?
Ayres — Sim. Chega um tempo em que o cargo tem o direito de nos ver pelas costas. Eu acho que entre oito e 12 anos está bom tamanho para o exercício do cargo.
ZH — Para encerrar ministro, o desfecho do mensalão pode ajudar a mudar o jeito de fazer política do Brasil?
Ayres - Sinaliza mais do que uma mudança, uma transformação, na linha do que disse Shakespeare: Transformação é uma porta que se abre por dentro. Transformar é mais do que mudar, porque significa você se ver ejetado para o plano da consciência, o mais alto do ser. Transformação significa atuar na cultura de um povo, e quando você atua na cultura você deflagra comportamentos de massa muito mais conscientes e sem possibilidade de retorno precedente. Sinaliza uma transformação nos nossos costumes políticos para melhor. O que o Supremo está dizendo é o seguinte: há um modo de fazer política, há um modo de fazer coalizão e alianças política que o Direito brasileiro execra, excomunga, não aceita.

DESTEMOR DO JUDICIÁRIO


Parece que se iniciou e já está instalado um clima de destemor positivo no Judiciário brasileiro. Este Juiz, assim com letra maiúscula, aliado à Juíza Calmon e, agora, ao Juiz Joaquim, em meio a muitos outros, mostram, todos eles mostram que a causa justa é maior que o medo de julgar. Sai vencedora a sociedade brasileira se esse processo se ampliar no meio judiciário.
Extraí o texto abaixo de Josias de Souza.
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Juiz da operação Monte Carlo acusa desembargador de impor constrangimentos e favorecer Cachoeira 

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Alderico Rocha Santos, juiz da Operação Monte Carlo, fez duros ataques ao desembargador Tourinho Neto, que cuida do caso no TRF-1, o Tribunal Regional Federal sediado em Brasília. Acusou-o de “impor constrangimentos” a ele e a outros dois magistrados que atuaram no processo em que figuram como réus Carlinhos Cachoeira e outras 80 pessoas. Acusou-o também de favorecer o bicheiro “criando fases processuais” não previstas na lei.
O juiz Alderico disse tudo isso por escrito, num ofício endereçado a Tourinho, com cópia para o Ministério Público Federal. Sob o número 115/2012, o documento tem três folhas. É datado de 22 de novembro, esta quinta-feira. O blog obteve uma cópia. Trata-se de resposta da 11ª Vara da Justiça Federal de Goiás a uma reclamação protocolada no TRF pela empresa Vitaplan, um laboratório farmacêutico que tem como sócios a ex-mulher e o ex-cunhado de Cachoeira: Andréa Aprígio de Souza e Adriano Aprígio de Souza.
A Vitaplan insurgiu-se contra uma ordem de Alderico. O juiz determinara o bloqueio das contas bancárias e aplicações financeiras da empresa. Por meio de seus advogados, a ex-mulher de Cachoeira alegou no TRF que a medida desrespeitou uma decisão do tribunal. Há cinco meses, num recurso relatado por Tourinho, a 2ª Seção do TRF havia liberado as contas do laboratório, derrubando despacho do juiz Paulo Augusto Moreira Lima, antecessor de Alderico no processo da Monte Carlo.
Submetido à reclamação contra o novo bloqueio, Tourinho enviou a Alderico um pedido de explicações. No texto, o desembargador expressou-se em termos inusitados. Anotou que ‘o juiz está na iminência de pular o corguinho”. Ordenou que se explicasse , “sem tergiversação”. Deu razão à Vitaplan: “…Não poderia o juiz de primeira instância cassar a decisão da 2ª Seção deste tribunal.”
Alderico abespinhou-se com o teor do ofício. Insinuou que Tourinho não lera seu despacho: “Ao contrário do afirmado, […] este juiz não cassou ou sequer afrontou a decisão da 2ª Seção desse tribunal, pois basta que se faça a leitura da decisão recorrida”. Didático, recordou que o TRF desbloqueara as contas da Vitaplan sob a alegação de que a providência “estava carente de fundamentação”.
Explicou que a situação agora é diferente: “A decisão deste juiz […] fundou-se em novos elementos de prova colhidos no bojo de inquéritos policiais instaurados para apurar crimes de lavagem de dinheiro por parte dos sócios e ‘laranjas’ da empresa Vitapan.” Alderico acrescentou: “A propósito, causam estranheza os termos censórios utilizados por esse douto relator [Tourinho], tanto em relação a este juiz quanto aos demais colegas que aturaram no processo, os doutores Paulo Augusto Moreira Lima e Daniel Guerra Alves.”
Os termos utilizados por Tourinho, escreveu Alderico, “têm imposto constrangimentos e elevada carga de estresse aos juízes que atuaram no processo da Operação Monte Carlo, além de receios, nos juízes que figuram como substitutos automáticos para o processo, de serem publicamente ridicularizados.” Titular da 5ª Vara Federal Criminal de Goiás, Alderico atua na 11ª Vara Federal como juiz substituto. Assumiu o processo contra Cachoeira depois que o outro magistrado, Paulo Moreira Lima, pediu afastamento do caso.
No ofício a Tourinho, Alderico recordou que nenhum dos juízes da Monte Carlo se dirigiu a ele em “termos chulos ou desrespeitosos.” Cobrou reciprocidade: “…O mínimo que se exige de um magistrado é equilíbrio, coerência e uso de termos comedidos, mais ainda quando se reporta a colegas.”
Alderico deu a entender que lhe sobrariam razões para dispensar a Tourinho o mesmo tratamento que recebe dele. Injetou no ofício uma grave acusação. Escreveu que, em decisão “monocrática” (individual), o desembargador estabeleceu “procedimento diverso da lei” para beneficiar Carlinhos Cachoeira.
Segundo Alderico, Tourinho estipulou “prazo e forma para as alegações finais” da defesa de Cachoeira antes que a 11ª Vara de Goiás tomasse qualquer decisão sobre a matéria. Fez isso “suprimindo a atuação desta primeira instância” e “criando fases processuais não contidas no Código de Processo Penal”. O juiz informou ao desembargador que a decisão causa-lhe “constrangimento”. Por quê? “Nas audiências, os advogados [dos outros réus] têm exigido que lhes seja dispensado o rito processual do Carlos Cachoeira, não o contido na lei.”
O juiz insinuou que o desembargador não dispõe de autoridade para cobrar “coerência”. Sem descer a detalhes, Alderico disse que Tourinho “se negou a prestar informações” sobre o processo requeridas por outro desembargador, Souza Prudente. “Além de ter afrontado por duas vezes decisão do STJ.”
Tourinho converteu-se em pedra no sapato dos magistrados que passaram pelo processo aberto contra Cachoeira e sua quadrilha. Não fosse pelo desembargador, Cachoeira ainda estaria na penitenciária da Papuda, em Brasília. Preso em 29 de fevereiro, nas pegadas da deflagração da Operação Monte Carlo, o bicheiro protocolara no STJ um pedido de habeas corpus.  Amargou resposta negativa.
Seus advogados foram bater às portas do TRF. Ali, obtiveram de Tourinho uma ordem de soltura. O STJ revogou. Tourinho voltaria a deferir um habeas corpus em favor de Cachoeira mais tarde. Dessa vez, o bicheiro só permaneceu em cana porque havia contra ele outra ordem de prisão, expedida pela Justiça de Brasília na Operação Saint Michel.
Nesta semana, Cachoeira foi condenado nesse processo de Brasília. Teve reconhecido o direito de recorrer em liberdade. Como a outra ordem de prisão já havia sido revogada por Tourinho, o réu foi ao meio-fio num instante em que o juiz Alderico redige a sentença de Goiás. Tourinho havia liberado Cachoeira sob o argumento de que o processo da Monte Carlo extrapolara os prazos. Abstivera-se de recordar que o caso arrastava-se além do necessário porque ele próprio determinara o trancamento da ação.
No texto que enviou a Tourinho, Alderico cuidou de refrescar-lhe a memória. Disse que os termos desrespeitosos do desembargor passam aos colegas dele no TRF “a ideia falsa de que os juízes de primeira instância estariam apaixonados pela causa” que envolve Cachoeira. Uma injustiça com juízes “profissionais e corajosos”, anotou. “Talvez não tanto quanto Vossa Excelência, por ter a coragem de ser o mesmo magistrado a suspender um processo e depois reconhecer o excesso de prazo”, acrescentou, irônico.
Nos dois derradeiros parágrafos do seu texto, Alderico caprichou na acidez. Primeiro, deu um conselho a Tourinho: se constatar “qualquer desvio de conduta deste magistrado, remeta os elementos probatórios pertinentes ao órgão competente para aplicação da pena de censura”, observados “o direito de defesa, o contraditório e o devido processo legal.”
No último parágrafo, o juiz informa ao desembargador que enviou cópia do ofício ao Ministério Público Federal. Para quê? A fim de que seja verificada “a prática de improbidade administrativa, quer seja deste magistrado ou do douto relator [Tourinho].” Mais explícito, impossível.
Tourinho deu de ombros para as explicações de Alderico. Deferiu o pedido de liminar formulado pelos advogados da Vitaplan, mandando desbloquear as contas bancárias do laboratório da ex-mulher de Cachoeira.

CORRUPÇÃO: CRIME HEDIONDO



A corrupção, especialmente a governamental, seja passiva ou ativa, e que promova a perda de recursos públicos, auferidos da arrecadação de impostos e por outros meios que possam sobrecarregar a sociedade, deve ser considerada CRIME HEDIONDO.
Isto porque ela mata. Mata o cidadão que não consegue o acesso a um serviço de saúde pública presto e adequado à doença aguda ou crônica. Mata, porque a falta de recursos públicos para o saneamento induz a que milhões de pessoas vivam em condições insalubres, favorecendo a ocorrência de doenças epidêmicas ou endêmicas que podem levar à morte. Mata, porque não permite uma oferta adequada em qualidade e quantidade de serviços escolares que possibilitem à sociedade ter a lucidez de definir seus caminhos de forma construtiva, afastando os vícios pessoais e grupais que levam à violência. Mata, enfim, porque esses mesmos agentes corruptivos promovem o extermínio entre si e, muitas vezes, contra os limpos que não querem se desviar. Há poucos dados oficiais ou oficiosos sobre mortes causadas por falta de atendimento à saúde, ao saneamento e à educação pública, correlacionados entre si, direta ou indiretamente, mas é suficiente mantermos os sentidos abertos para as notícias diárias, para percebermos o seu quantitativo. Então, corrupção deveria ser tratada como CRIME HEDIONDO, sim.
Extraí o texto abaixo do INSTITUTO MILLENIUM.
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Lei anticorrupção se arrasta no Congresso Nacional


  
Brasil sofre cobrança para punir empresas corruptas; projeto está em xeque
BRASÍLIA e RIO – O Brasil se tornou alvo de pressão internacional porque protela a aprovação de uma lei anticorrupção que puna até mesmo com a extinção empresas que pagam suborno para fechar negócios dentro e fora do país. O governo levou a proposta ao Congresso em 2010, mas a tramitação se arrasta em uma Comissão Especial da Câmara desde setembro do ano passado. Deputados da comissão, ouvidos pelo GLOBO na última semana, afirmam que o atraso é provocado pelo lobby de empresas de engenharia e de construção civil, contrárias ao texto do Executivo.
Por trás do embate está a responsabilização administrativa e judicial das empresas — e não só seus representantes flagrados em atividades ilícitas. Se já estivesse em vigor, a lei poderia, em tese, sepultar a Delta Construções, empreiteira cujos ex-diretores foram presos sob acusação de negociar ilicitamente contratos públicos, até mesmo sob o comando do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Entre as penalidades previstas na lei em debate está multa de até 20% do faturamento bruto do último exercício anterior à instauração do processo administrativo. Em 2011, só em contratos com o governo federal, a Delta faturou R$ 862 milhões.
Os parlamentares da comissão, sob a condição do anonimato, revelam que, além do caso Delta, o desfecho do julgamento do mensalão, com identificação da cadeia de comando do esquema, pôs diretores e representantes de empreiteiras em alerta. O movimento contrário ao texto do relator, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), defende o substitutivo apresentado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, na avaliação do governo, desfigura o projeto e retira a responsabilização objetiva das empresas na esfera judicial.
— É preciso definir melhor o limite da responsabilidade. A empresa não pode ser responsabilizada, por exemplo, por um ato individual de um office-boy que não tenha tido o conhecimento da direção — sustenta Cunha.
Planalto já identificou lobby
O articulado lobby na comissão especial vem dando certo até agora. Não há qualquer acordo para a votação do projeto. Cunha é o interlocutor procurado pelo governo para negociar concessões à proposta.
O Brasil se comprometeu em aprovar a lei contra a corrupção ao se tornar signatário da Convenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) contra o Suborno Transnacional, no ano 2000. A OCDE é um órgão de desenvolvimento formado por 34 países, a maioria ricos da Europa e da América do Norte.
Em 8 de outubro, durante reunião em Paris, o presidente do grupo de trabalho da convenção, Mark Pieth, afirmou que o Brasil corre sério risco por não cumprir integralmente os compromissos da convenção. E alertou que a OCDE poderia recomendar às empresas de países-membros que não façam negócios com empresas daqui. Além do Brasil, considerado parceiro-chave da OCDE, a Argentina é o único país signatário que não tem uma lei para punir empresas corruptas.
— A aprovação desse projeto dará ao poder público um instrumento muito mais eficaz para se defender das empresas fraudadoras e desonestas, alcançando-as naquilo que lhes é mais sensível, o patrimônio. A lei vai retirar o Brasil da desconfortável situação de devedor inadimplente de uma obrigação solenemente assumida quando ratificou a Convenção da OCDE contra o Suborno Transnacional — diz o ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage.
A lei anticorrupção foi elaborada pela CGU, em parceria com a Advocacia Geral da União (AGU) e com a Casa Civil da Presidência. Levantamento do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) mostra que US$ 6 bilhões (R$ 12 bilhões) foram recuperados em países com leis de combate ao suborno transnacional. O Brasil, por não ter uma lei própria, ficou fora do levantamento.
A movimentação das empreiteiras para barrar a proposta já foi detectada pela Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República. Um dos deputados integrantes da comissão contou ao GLOBO ter recebido a ligação de um empresário preocupado com as novas interpretações do STF sobre o crime de corrupção. A ligação foi para pedir o veto ao projeto anticorrupção. Os primeiros telefonemas, no entanto, começaram após a crise da Delta.
Presidentes de associações de empresas de engenharia e de construção civil procuraram outro deputado em seu gabinete na Câmara. Também pediram que não apoiasse o projeto.
A lei brasileira, hoje, permite a punição apenas de gestores acusados de pagamento de propina em território nacional. A punição máxima possível é o que a CGU fez, por exemplo, com a Delta: a declaração de inidoneidade e a consequente impossibilidade de firmar novos contratos com a União. Nas contas do governo, se o texto do relator Zarattini for aprovado na comissão, em caráter terminativo, a oposição silenciosa ao projeto deve reunir 52 assinaturas para levar o texto ao plenário, onde o Planalto teme ser derrotado.
O Globo, 17/11/12

SINAL DE VIDA


Eis mais um artigo que revigora o pensamento e fortalece a crença nos fundamentos democráticos e republicanos. Eis, então, mais um artigo de Fernando Henrique Cardoso, o estadista de fato. Não acompanho apenas a trajetória dele desde quando Presidente ou, agora, como contraponto ao regime petista que nos governa. Acompanho-o e à sua obra desde a década de 70, quando li seu primeiro livro “A ESCRAVIDÃO NO BRASIL MERIDIONAL”, pelo qual faz uma análise do processo escravagista no Rio Grande do Sul, e outros livros e textos de cursos humanistas que frequentei.

Desde aquela época, nada mais do que temas acadêmicos, mas profundos e renovadores de ideias.

Agora, como ex-Presidente, vem marcando e definindo princípios filosóficos de cidadania, de política e de comportamento civilizado, necessário aos governantes e às instituições que nos governam.

Abaixo, pois, um belo texto para pensar.


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Sinal de vida

Fernando Henrique Cardoso

 

A condenação clara e indignada, por ministros do Supremo Tribunal Federal, do mau uso da máquina pública revigora a crença na democracia
Tenho dito e escrito que o Brasil construiu o arcabouço da democracia, mas falta dar-lhe conteúdo. A arquitetura é vistosa: independência entre os poderes, eleições regulares, alternância no poder, liberdade de imprensa e assim por diante. Falta, entretanto, o essencial: a alma democrática.
A pedra fundamental da cultura democrática, que é a crença e a efetividade de todos sermos iguais perante a lei, ainda está por se completar. Falta-nos o sentimento igualitário que dá fundamento moral à democracia. Esta não transforma de imediato os mais pobres em menos pobres. Mas deve assegurar a todos oportunidades básicas (educação, saúde, emprego) para que possam se beneficiar de melhores condições de vida. Nada de novo sob o sol, mas convém reafirmar.
Dizendo de outra maneira, há um déficit de cidadania entre nós. Nem as pessoas exigem seus direitos e cumprem suas obrigações, nem as instituições têm força para transformar em ato o que é princípio abstrato.
Ainda recentemente um ex-presidente disse sobre outro ex-presidente, em uma frase infeliz, que diante das contribuições que este teria prestado ao país não deveria estar sujeito às regras que se aplicam aos cidadãos comuns... O que é pior é que esta é a percepção da maioria do povo, nem poderia ser diferente, porque é a prática habitual.
Pois bem, parece que as coisas começam a mudar. Os debates travados no Supremo Tribunal Federal e as decisões tomadas até agora (não prejulgo resultados, nem é preciso para argumentar) indicam uma guinada nessa questão essencial. O veredicto valerá por si, mas valerá muito mais pela força de sua exemplaridade.
Condenem-se ou não os réus, o modo como a argumentação se está desenrolando é mais importante do que tudo. A repulsa aos desvios do bom cumprimento da gestão democrática expressada com veemência por Celso de Mello e com suavidade, mas igual vigor, por Ayres Britto e Cármen Lúcia, são páginas luminosas sobre o alcance do julgamento do que se chamou de “mensalão”.
Ele abrange um juízo não político-partidário, mas dos valores que mantêm viva a trama democrática. A condenação clara e indignada do mau uso da máquina pública revigora a crença na democracia. Assim como a independência de opinião dos juízes mostra o vigor de uma instituição em pleno funcionamento.
É esse, aliás, o significado mais importante do processo do mensalão. O Congresso levantou a questão com as CPIs, a Polícia Federal investigou, o Ministério Público controlou o inquérito e formulou as acusações, e o Supremo, depois de anos de dificultoso trabalho, está julgando.
sociedade estava tão desabituada e descrente de tais procedimentos quando eles atingem gente poderosa que seu julgamento — coisa banal nas democracias avançadas — transformou-se em atrativo de TV e do noticiário, quase paralisando o país em pleno período eleitoral. Sinal de vida. Alvíssaras!
Não é a única novidade. Também nas eleições municipais o eleitorado está mandando recados aos dirigentes políticos. Antes da campanha acreditava-se que o “fator Lula” propiciaria ao PT uma oportunidade única para massacrar os adversários. Confundia-se a avaliação positiva do ex-presidente e da atual com submissão do eleitor a tudo que “seu mestre” mandar.
É cedo para dizer que não foi assim, pois as urnas serão abertas esta noite. Mas, ao que tudo indica, o recado está dado: foi preciso que os líderes aos quais se atribuía a capacidade milagrosa de eleger um poste suassem a camisa para tentar colocar seu candidato no segundo turno em São Paulo. Até agora o candidato do PT não ultrapassou nas prévias os minguados 20%.
No Nordeste, onde o lulismo com as bolsas-família parecia inexpugnável, a oposição leva a melhor em várias capitais. São poucos os candidatos petistas competitivos. Sejam o PSDB, o DEM, o PPS, sejam legendas que formam parte “da base”, mas que se chocam nestas eleições com o PT, são os opositores eleitorais deste que estão a levar vantagem.
No mesmo andamento, em Belo Horizonte, sob as vestes do PSB (partido que cresce), e em Curitiba são os governadores e líderes peessedebistas, Aécio Neves e Beto Richa, que estão por trás dos candidatos à frente. Em um caso podem vencer no primeiro turno, noutro no segundo.
Não digo isso para cantar vitória antecipadamente, nem para defender as cores de um partido em particular, mas para chamar a atenção para o fato de que há algo de novo no ar. Se os partidos não perceberem as mudanças de sentimento dos cidadãos e não forem capazes de expressá-las, essa possível onda se desfará na praia.
O conformismo vigente até agora, que aceitava os desmandos e corrupções em troca de bem-estar, parece encontrar seus limites. Recordo-me de quando Ulysses Guimarães e João Pacheco Chaves me procuraram em 1974, na instituição de pesquisas onde eu trabalhava, o Cebrap, pedindo ajuda para a elaboração de um novo programa de campanha para o partido que se opunha ao autoritarismo.
Àquela altura, com a economia crescendo a 8% ao ano, com o governo trombeteando projetos de impacto e com a censura à mídia, pareceria descabido sonhar com vitória. Pois bem, das 22 cadeiras em disputa para o Senado, o MDB ganhou 17. Os líderes democráticos da época sintonizaram com um sentimento ainda difuso, mas já presente, de repulsa ao arbítrio.
Faz falta agora, mirando 2014, que os partidos que poderão eventualmente se beneficiar do sentimento contrário ao oportunismo corruptor prevalecente, especialmente PSDB e PSB, disponham-se cada um a seu modo ou aliando-se a sacudir a poeira que até agora embaçou o olhar de segmentos importantes da população brasileira.
Há uma enorme massa que recém alcançou os níveis iniciais da sociedade de consumo que pode ser atraída por valores novos. Por ora atuam como “radicais livres” flutuando entre o apoio a candidatos desligados dos partidos mais tradicionais e os candidatos daqueles dois partidos.
Quem quiser acelerar a renovação terá de mostrar que decência, democracia e bem-estar social podem novamente andar juntos. Para isso, mais importante do que palavras são atos e gestos. Há um grito parado no ar. É hora de dar-lhe consequência.


A MORTE DO NADA


Eis mais um belo e instigante texto de Marcelo Gleiser, expondo mais das ansiedades que cercam os mistérios, as dúvidas e os desencontros da ciência acerca do Universo. Ou, agora, do Multiverso, já que passam a existir teorias de que estamos num dos vários Universos existentes.
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 A morte do Nada, por MARCELO GLEISER

Desde o início, a filosofia pergunta se existe espaço vazio no Universo; agora, o Nada bateu as botas
É com grande pesar que vos informo da morte do Nada. Pois é, caro leitor, após mais de dois milênios de ambiguidades e confusões, parece que desta vez o Nada bateu mesmo as botas. São coisas que temos de aceitar em vista da evidência extremamente convincente vinda tanto da física das partículas elementares -que visa explicar a composição mais fundamental da matéria- como da astronomia. Comecemos com as partículas.
A questão da composição material do mundo é tão velha quanto a filosofia; foi Tales, o primeiro dos filósofos gregos, que perguntou: "Do que o mundo é feito?".
Desde então, a discussão girou em torno da questão do vazio ou, menos precisamente, do Nada: existe o espaço vazio, destituído de qualquer tipo de matéria ou substância? Ou será que algo o preenche, como o ar preenche nossa atmosfera?
Um tremendo vaivém se deu com o passar dos séculos, tema que volta e meia tratamos aqui neste espaço. Os atomistas gregos supuseram que existiam apenas átomos se movendo no vazio, enquanto que Aristóteles considerava a hipótese do vazio absurda: preencheu o Cosmo com uma quinta-essência, o éter que compunha os objetos celestes e, de forma difusa, enchia o espaço, tornando-o pleno.
Depois, veio Descartes com seus vórtices de uma substância fluida que enchia o universo, tese desmentida de forma muito lúcida por Newton no final do século 17. Atomista também ele, o mestre inglês provou claramente que, se alguma substância preenchesse o espaço, causaria fricção nas órbitas planetárias e o Sistema Solar não existiria como o vemos.
Veio, então, a luz como onda eletromagnética, no século 19, necessitando de um meio material para se propagar; o éter retorna, com essa função, até que, em 1905, Einstein demonstra sua inutilidade. Porém, em 1917, ele mesmo sugere que, se o Universo é esférico e estático, deveria ser preenchido por uma substância estranha, cuja função seria atuar como uma espécie de antigravidade, equilibrando a atração de todas as coisas. Mas o Universo não é estático e, em 1929, a tal constante cosmológica é deixada de lado. Provisoriamente.
No meio tempo, físicos de partículas descobriram os componentes básicos da matéria comum. Destes, o bóson de Higgs tem o papel singular de atribuir massa a todas as outras partículas. Para tal, encontra-se por todo o espaço uma espécie de ar que não é ar mas por onde todas as partículas de matéria se movem. E, ao fazê-lo, respondem à presença do Higgs com inércias próprias, como pérolas movendo ora em água ora em mel. O espaço, segundo a física do muito pequeno, não pode ser vazio.
E nem o Cosmo nas suas proporções maiores: em 1998, astrônomos descobriram que as galáxias se afastam de forma acelerada, levadas pela expansão cósmica como objetos numa enchente. A causa dessa aceleração, com efeito idêntico ao termo que Einstein inseriu e depois descartou nas equações de sua teoria da relatividade, é uma espécie de fluido preenchendo todo o espaço, primo do Higgs mas não ele, um outro tipo de éter, chamado provisoriamente de energia escura. Existimos numa natureza plena-plena de essências e mistérios.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor de "Criação Imperfeita". Facebook: goo.gl/93dHI

NO IMAGINÁRIO FEMININO O POLÍTICO É A ÚLTIMA ESCOLHA


Em princípio, ao ler o texto, situei-o no terreno das frivolidades e não dei importância a ele. Mas, pensando bem, vi que representava mais uma manifestação contra uma classe da sociedade que já foi importante e respeitada, mas que, hoje, está em decadência no conceito da população, externada até mesmo no terreno dessa pesquisa noticiada. Mas, e daí? Daí, que para quem conhece um pouco da História, e delimitando a análise ao tempo recente, lembra que até há algumas décadas o político era figura proeminente e respeitada nas comunidades e no âmbito nacional. No entanto, atualmente, esse elemento (termo  utilizado na linguagem policialesca) é objeto de boas comédias e charges (ou más, não sei!) que provocam o riso popular. Provocam o riso, mas é um riso trágico de quem percebe a degradação técnica, operacional e moral de um dos pilares que sustentam a República. Mas, o trágico não para por aí, pois a tragédia maior é que se a classe política está degenerada é culpa do eleitor, pois este é o patrão e o político é o empregado. Não somos bons gerentes, pois!

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Os efeitos do livro "50 Tons de Cinza" lembram profissionais da Advocacia Espaço Vital, 13/11/2012



Uma pesquisa realizada com os usuários italianos do C-date, saite mundial de relacionamento voltado para o "casual dating" ou "encontros casuais", mostra que sete em cada dez mulheres têm curiosidades e fantasias diferentes quando o tema é sexo. 


Segundo o C-date, esse comportamento tem um impacto significativo do livro "50 Tons de Cinza", que já alcançou 20 milhões de cópias vendidas nos Estados Unidos e Europa e que também alcançou as praias italianas. 
De fato, sob o guarda-sol da Itália, parece que as mulheres leem e falam basicamente sobre o que está no livro. A tabulação final da pesquisa conclui que "em se tratando de sexo há muitas coisas para fazer muito além de uma simples fantasia sobre o par masculino desejado". 

Ao todo foram entrevistadas 860 mulheres italianas entre 20 e 55 anos. Os resultados foram surpreendentes:
* No ranking sobre os homens com apelo sexual, as mulheres italianas preferem o banqueiro e um personal trainer como "parceiros casuais". Os políticos em geral deslizam para o último lugar. 
* As mulheres italianas que gostariam de vivenciar experiências inusitadas entre quatro paredes estão fortemente divididas. Menos da metade respondeu que o único homem com quem elas aceitariam realizar as "brincadeiras" seria o próprio marido ou namorado (46%), o que leva a acreditar que para esse tipo de experiência elas gostariam, em sua maioria, de realizar com um parceiro casual (54%). 

* Entre os perfis de homens que mais instigam a imaginação das mulheres ficou em primeiro lugar o "homem de poder" (33%) como os banqueiros - mais citados que os empresários (26%). Em terceiro lugar está o personal trainer (21%), seguido de profissionais liberais (advogados, 15%) e contadores (5%).
Outros profissionais também estão no imaginário feminino, embora, de acordo com a pesquisa, em menor grau, como o açougueiro, o encanador, o salva-vidas e - como visto acima - em último lugar o político.

CAMUS: a relação vocabulário X tempo


Eis um texto lúcido de Brossard acerca do clima de insegurança que vivenciamos no Brasil. A breve análise dele faz com que lembremos o comparativo de mortos pela violência pessoal, sem contar a de trânsito, no Brasil, anualmente. São dados que superam muitas guerras de muitos países. Embora ele defenda a tese que vivemos uma guerra civil, pelos argumentos que apresenta, eu compreendo ambas as definições, pois se estamos em um conflito aberto, também estamos numa sociedade doente de comportamento.

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Guerra civil ou epidemia, por PAULO BROSSAR DE SOUZA PINTO

(INSTITUTO MILLENIUM)


  
Pouco importa que lhe demos o nome de peste ou febre. O essencial é impedir a morte de metade da população

Se há um fato que entra pelos olhos de qualquer pessoa é o da violência generalizada e crescente; como se ela não bastasse, tem se agravado com requintes de crueldade; a morte não basta e a ela seguem-se mutilações várias nas vítimas, degola inclusive, para não falar em outras; os meios de comunicação dia a dia confirmam essa realidade.
Insisto em acentuar a coexistência de duas espécies de violência, a que vem de tempos imemoriais e a recente, originária ou consorciada ao fenômeno da droga e o que dela decorre, como a reação à ação policial. O número de policiais mortos e feridos não deixa dúvida a propósito das dimensões do problema, tanto que serviços federais vão colaborar com o Estado de São Paulo, não sei em que termos e de que forma, mas a União assumiu publicamente essa posição, e não terá sido por somenos. A verdade é que, nas últimas semanas, tem se agravado o problema em número e intensidade, como vem adquirindo marcas inegáveis da alteração de seu caráter; a meu sentir, a violência passou a ser instrumento de uma ação coletiva com particulares objetivos ilícitos. Em outras palavras, se a violência se expandia empiricamente, hoje se assemelha a uma entidade habilitada a atingir seus objetivos, fossem eles quais fossem. É o que vem ocorrendo à luz do sol, na maior cidade do país e no mais desenvolvido Estado da União, em termos ameaçadores. O número de policiais mortos e feridos fala por si; basta sinalar que os servidores do setor de segurança vêm sendo o alvo predileto da luta armada. Para mostrar que o comando em causa não está a brincar, em dias passados, à frente de sua casa, à tarde, foi morta uma policial que se recolhia, com numerosos balaços. É apenas um dado, mas um dado que resume o que está nas origens do fenômeno e em suas finalidades.
Há pessoas que não simpatizam e até têm repugnância à expressão “guerra civil”; a mim o fato repugna mais que a expressão, e o que está ocorrendo caracteriza o que se chama de “guerra civil”. São forças estranhas à nomenclatura estatal, com recursos próprios, que hostilizam serviços estatais fundamentais, levando à morte pessoas dedicadas à segurança pública, isto me faz lembrar uma passagem de Albert Camus, em A Peste, ao dizer que “a questão não é de vocabulário, mas de tempo. Pouco importa que lhe demos o nome de peste ou febre. O essencial é impedir a morte de metade da população”.
Por tudo que estou a ver, tenho o desgosto de reconhecer a ocorrência de uma forma da guerra civil, calamidade que Gaspar Silveira Martins disse, em texto histórico, ser o maior flagelo que pode cair sobre um povo.
Denomine-se de guerra civil ou se batize com o mais delicado eufemismo, pouco importa, se todas as noites policiais são abatidos no território do maior Estado da federação. A questão não é de vocabulário, é de brasileiros eliminados em sua própria casa.


GATILHOS CORPORAIS DA SAÚDE MENTAL

A publicação abaixo, traduzida automaticamente, é do THE ECONOMIST, uma respeitável e antiga publicação inglesa. Publico-a por pensá-la útil...